Joseph Campbell apresentou no livro “The Hero with a Thousand Faces” o arquétipo do herói. Um modelo que se encaixa em praticamente todos os personagens que você possa imaginar (Batman, Superman, Jesus Cristo, Nelson Mandela, etc). São três fases: A iniciação do herói (quando ele não está pleno no universo que vive e se entrega à missão); A transformação (quando ele enfrenta seus medos e descobre, na adversidade, do que é capaz); O retorno (quando ele sai do casulo e se torna aquilo que ele nasceu para ser). Mas o Chapolin Colorado não se encaixa nesse contexto. E este é um sinal de que estamos falando de um dos personagens mais inteligentes já criados na América Latina.
Enquanto a maior parte dos heróis são fortes, rápidos, inteligentes, astutos ou com poderes inexplicáveis, o Colorado é o oposto. Fracote, tapado, burro, feio, covarde, desajeitado e o único poder que tem, além das anteninhas de viníl (que detectam a presença do inimigo), são as pastilhas de nanicolina, que o deixam ainda menor e mais frágil. Parece até que falamos sobre um pirado que se veste de vermelho. Mas se isso fosse verdade, como é que esse personagem envolve tantas pessoas (e países) e faz sucesso há mais de 40 anos? A resposta é óbvia: Chespirito é um dos maiores gênios que a televisão já conheceu.
Diferente da maior parte dos diretores de TV (e talvez de outros mercados da comunicação?) Chespirito sabia que uma boa idéia poderia ser executada de forma simples e inteligente. Sem grandes recursos, verbas ou mesmo tecnologia. E não venha me dizer que na década de 70 isso não existia, que eu faço uma lista de filmes que usaram e abusaram disso!
Era outra época, com outro foco: onde as piadas ainda não eram associadas a pinto e bunda. E vimos sketches sobre personagens tão importantes da história e da literatura, como Leonardo Da Vinci, Sherlock Holmes, Sigmund Freud, Sansão, Dom Quixote, Napoleão e outros nomes que provavelmente a geração Bakugan de hoje não faz a menor idéia de quem foram.
Mais do que boas idéias, Chespirito nos ensinou que é por ser fracote, tapado, burro, feio, covarde e desajeitado – defeitos que todos temos – que o Chapolin é um verdadeiro herói. Pois consegue superar seu medo e fazer o que é preciso. E aqueles que não tem medo de nada (segundo o arquétipo de Campbell), não passam de imprudentes.
O Chapolin é a prova de que boas idéias superam gerações, falta de verba, de recursos ou até mesmo de equipe. É um fenômeno muito parecido com o que vemos hoje em dia na internet: pessoas com boas idéias, criando conteúdos incríveis e se tornando web celebrities.
Aliás, esse apelido, dado por Agustin Delgado (“La Batalla de los Pasteles”), já fala sobre a genialidade do sujeito: Chespirito é o diminutivo (na fonética deles) de Shakespeare. Isso por conta do nível envolvente e versátil das histórias e personagens que Roberto Gómez Bolaños (o Chespirito) escrevia. Ou vai me dizer que você NUNCA chorou vendo o Chaves ir embora da vila? Eu duvido.
Post originalmente publicado no Brainstorm #9
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