Em 1951 o arquiteto Oscar Niemeyer projetou sua nova residência em São Conrado, no Rio de Janeiro. E apresentou o projeto, conhecido como “Casa das Canoas”, assim:
Minha preocupação foi projetar essa residência com inteira liberdade, adaptando-a aos desníveis do terreno, sem o modificar, fazendo-a em curvas, de forma a permitir que a vegetação nelas penetrasse, sem a separação ostensiva da linha reta.
Dois anos depois, o fundador da Bauhaus Walter Gropius – que havia recentemente abandonado seu cargo como Diretor da Escola de Arquitetura de Harvard – veio ao Brasil para ser jurado do Prêmio de Arquitetura da 2ª Bienal de São Paulo. E como era de se imaginar, os dois genios se encontraram e Niemeyer o convidou para uma visita na Casa das Canoas.
Gropius, precursor do funcionalismo e radicalmente contra o pensamento singular e individualista na arquitetura e no design, conheceu a tal casa, e comentou:
“Sua casa é bonita, mas não é multiplicável”.
Niemeyer ficou puto. E nitidamente ergueu essa discussão como uma bandeira. E disse ao Correio Braziliense:
E o chefe do negócio, o Walter Gropius, era um babaca completo.
“A Bauhaus, que é a turma mais imbecil que apareceu, chamava a arquitetura de a casa habitat. Não interessava a forma, desde que o quarto estivesse perto do banheiro, a cozinha perto da sala e funcionasse bem. Foi um período de burrice que conseguimos vencer. A escola que eles construíram nunca ninguém pensou nela, porque não tem interesse nenhum, ninguém nunca ouviu falar. E o chefe do negócio, o Walter Gropius, era um babaca completo. Ele foi na minha casa nas Canoas, subiu comigo e disse a maior besteira que já ouvi: “Sua casa é muito bonita, mas não é multiplicável”. Pensei: que filho da puta! Para ser multiplicável teria que ser em terreno plano, teria que procurar um terreno igual e meu objetivo não era uma casa multiplicável, era uma casa boa para eu morar. Eles eram assim, sem brilho nenhum. E o trabalho que ele deixou é um monte de casas que se repetem. Foi um momento que ameaçou a arquitetura, mas Le Corbusier e os outros reagiram. Foi um momento em que a burrice queria entrar na arquitetura, mas foi reprimida.”
É claro que nenhum deles estava certo – ou errado. Tanto Gropius quanto Niemeyer são nomes cravados na história da arquitetura, com pensamentos e características únicas. E mesmo Niemeyer, que criticou com mão de ferro a Bauhaus, com certeza a usou como inspiração para desenvolver os Ministérios de Brasília, assim como toda a gama de prédios residenciais e comerciais na nova capital do país: projetos multiplicáveis, funcionais e pensados para o “todo”, e não no indivíduo.
E quanto a nós, mortais, resta continuar pesquisando, estudando e (com sorte) um dia começar a entender tudo o que esses caras deixaram para nós.
Post originalmente publicado no Brainstorm #9
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