A demanda da humanidade por energia está crescendo a um ritmo surpreendente. Combine isso a uma oferta cada vez menor de combustíveis fósseis, e fica dolorosamente claro que é necessário algo inovador e poderoso.
Mas há uma proposta de alta tecnologia que promete muito, uma ideia que existe desde os anos 1960: veja como a energia solar capturada no espaço poderá resolver todas as nossas necessidades de energia na Terra.
Os humanos precisam de mais energia
Assumindo que o progresso econômico e a globalização continuem no ritmo atual, em 2030 será necessário produzir o dobro da quantidade de energia que consumimos hoje. Isso corresponderá a monumentais 220 trilhões de quilowatts-hora por ano. E até o final do século, precisaremos de quatro vezes a taxa atual de consumo.
E tão importante quanto isso: nós também teremos que deixar de lado o hábito de combustível fóssil – e não só porque ele, uma hora, vai acabar. O aumento das emissões de CO2 estão causando estragos na atmosfera da Terra, o que está criando efeitos colaterais no meio ambiente a uma taxa mais rápida do que o esperado.
Além disso, se queremos que os gases de efeito estufa sejam colocados sob controle ao longo das próximas décadas, precisaremos obter mais de 90% de toda a nossa energia a partir de fontes renováveis ou nucleares.
Embora haja uma série de propostas sobre como podemos responder a estes desafios, nenhuma parece ser realmente viável…
…com exceção de satélites movidos a energia solar.
Benefícios óbvios
Um olhar mais atento a esta solução baseada no espaço traz uma longa lista de vantagens.
Satélites movidos a energia solar não produzem quaisquer gases de efeito estufa, nem ocupam espaço valioso na Terra. E uma vez pagos os custos iniciais, eles seriam relativamente baratos de se manter. Os módulos solares usados para a geração de energia solar têm uma vida útil longa, sem mencionar o ROI (retorno sobre o investimento) surpreendente que viria de uma fonte de energia praticamente ilimitada.
Além disso, eles não estão limitados por ciclos dia/noite, pelo tempo/clima, ou pela mudança das estações. E, de fato, eles seriam muito mais eficientes do que qualquer tipo de estação baseada na Terra. A coleta de energia solar no espaço é sete vezes maior (por unidade de área) do que na superfície do planeta. Além disso, a quantidade de energia solar disponível lá em cima é impressionante – na ordem de bilhões de vezes maior do que obtemos hoje. A Terra recebe apenas 1/2.300.000.000 da energia gerada pelo Sol. O potencial de escalabilidade é enorme, para dizer o mínimo.
Satélites movidos a energia solar não seriam propensos a ataques terroristas, e reduziriam a pressão geopolítica por petróleo. De acordo com o futurista Keith Henson, a energia solar capturada do espaço pode ser usada para mover veículos, como carros elétricos, ou permitir a produção de combustíveis sintéticos – que, custando um centavo de dólar por quilowatt-hora, resultariam em gasolina que custaria R$0,50 por litro.
Ao mesmo tempo, essa energia solar daria independência energética de verdade para as nações que optarem por implementá-la. E além disso, essa energia poderia ser exportada para qualquer lugar do mundo, e seria especialmente valiosa para áreas isoladas do mundo, incluindo África e Índia.
Por fim, a energia solar capturada no espaço também traria benefícios tremendos para a exploração espacial humana e robótica, incluindo o fornecimento de energia para colônias na Lua, Marte e estações espaciais. Ele poderia também servir como a primeira semente no desenvolvimento de uma Esfera de Dyson – uma matriz de coletores solares que iria cobrir o Sol a uma distância de cerca de 1 UA (unidade astronômica, cerca de 150.000.000 km).
Como vai funcionar
No final dos anos 1960, Peter Glaser propôs a ideia de satélites movidos a energia solar (SPS), que ele imaginou como células fotovoltaicas no espaço que poderiam transferir energia sem fio de volta à Terra. Seu projeto exigia uma grande plataforma posicionada no espaço em uma órbita alta, que iria recolher a energia solar e convertê-la em eletricidade. Por sua vez, essa energia seria usada para conduzir uma transmissão sem fio de energia (WPT), que transmitiria a energia solar para estações de recepção na Terra – o que seria composto de grandes antenas receptoras.
Alguns visionários atualizaram a visão de Glaser para incluir o uso de um transmissor de energia sem fio por micro-ondas. Isto envolveria grandes estruturas separadas (como um painel solar e um transmissor) que seriam montados no espaço. Sistemas SPS poderiam também incluir um conceito WPT modular com lasers, envolvendo módulos solares que se automontariam. Outros projetos exigem um conceito WPT SPS de “estrutura sanduíche” modular, exigindo um número significativo de pequenos módulos solares que seriam montados roboticamente em órbita.
Mas para que isso aconteça, precisamos desenvolver veículos de lançamento ecológicos e de baixo custo. Nós poderíamos enviar os materiais em um elevador espacial, mas enquanto não realizamos isto, nós teremos que criar algo mais eficiente. Felizmente, a SpaceX e outras empresas privadas já estão trabalhando em soluções de lançamento mais eficientes.
Além disso, precisaremos de construção em larga escala e estações em órbita – locais de trabalho no espaço que seriam maiores, mais complexos, e que exigiriam mais energia do que a Estação Espacial Internacional (ISS). Eles permitiriam a produção de grandes painéis simples, fáceis de montar, que consistiriam de várias peças idênticas. No futuro, seria possível até mesmo construir uma frota inteira destes coletores solares usando materiais extraídos de asteroides.
Propostas de design
À medida que mais pessoas reconhecem o potencial dos SPS, e à medida que a tecnologia alcança a ideia, foram formuladas uma série de propostas de design. E isso não é mais apenas mera especulação: é algo que está quase pronto para virar realidade.
Por exemplo, o SPS-ALPHA (Satélite de Energia Solar via Agrupamentos por Fase Arbitrariamente Grandes), que está sendo desenvolvido por John Mankins, da NASA. Utilizando uma abordagem “biomimética”, o projeto prevê enormes plataformas construídas a partir de milhares de pequenos elementos, que poderiam fornecer dezenas de milhares de megawatts transmitindo energia sem fio.
Ele faria isso usando uma grande quantidade de espelhos cobertos por uma película fina, e controlados individualmente, colocados na superfície curva de um satélite. Esses espelhos ajustáveis iriam interceptar e redirecionar a luz solar para células fotovoltaicas afixadas atrás do satélite. O lado que aponta para a Terra teria um conjunto de painéis de transmissão de micro-ondas. Eles gerariam um feixe único e de baixa intensidade de radiofrequência, que seria transmitido para a Terra.
E o que é particularmente interessante sobre este conceito é que ele permitiria a construção de um satélite de energia solar que poderia ser montado inteiramente a partir de elementos individuais do sistema que não pesam mais de (50-200 kg), permitindo que todas as peças fossem produzidas em massa a baixo custo.
Há também o sistema SBSP, da JAXA. A agência espacial japonesa quer um protótipo em funcionamento até 2020, e um sistema totalmente operacional até 2030.
O sistema deles é projetado para funcionar em uma órbita estacionária a cerca de 36.000 km acima do equador, onde ele irá absorver a luz solar com células solares incrementadas com cromo. O sistema SBSP vai transmitir energia para a Terra usando feixes de laser com cerca de 42% de eficiência. Cada satélite vai transmitir energia para uma estação receptora com 3 km de largura, que vai produzir um gigawatt de energia elétrica – o bastante para abastecer 500.000 casas.
Outros exemplos incluem a Sun Tower, o satélite Dyson-Harrop (que aproveitaria a energia dos ventos solares), o Solar Disk, e o SPS European Sail Tower.
Prazos
Os SPS têm sido discutidos desde os anos 70, e foram revistos periodicamente por várias partes interessadas no mundo – mas a ideia nunca foi vista como algo rentável ou tecnologicamente viável. Estes sentimentos estão mudando, no entanto.
No ano passado, a Academia Internacional de Astronáutica publicou um relatório exaustivo elogiando os benefícios da energia solar obtida no espaço, exortando a comunidade internacional a tomar a sério essa perspectiva. O relatório contém mais de uma dezena de recomendações sobre como começar, enquanto prevê que a energia solar espacial será tecnicamente viável dentro de 10 a 20 anos, utilizando tecnologias que já existem.
Os autores também notaram que o projeto seria economicamente viável nas próximas décadas, mas em condições específicas que têm a ver com os mercados futuros de energia e da disposição dos governos para começar (o que poderia ser motivado por preocupações ambientais).
Além disso, experimentos de voo serão necessários, assim como a decisão de políticas ou questões regulatórias – o que definitivamente pode levar algum tempo. Nem precisamos mencionar que alguns grupos e indivíduos podem não gostar da ideia de micro-ondas e raios laser atingirem a superfície da Terra – para não mencionar o potencial pesadelo de que essa tecnologia poderia virar uma arma.
E em termos de gastos, a IAA propôs um esquema de partilha de custos em que as nações trabalhariam em conjunto para reduzir o preço – que poderia chegar a um trilhão de dólares.
Mas dados os incríveis benefícios – para não mencionar a enorme necessidade – isso precisa acontecer.
Fontes:
- National Space Society
- Academia Internacional de Astronáutica
- KurzweilAI
- AZO CleanTech
- Keith Henson, “Um futuro incerto e gasolina por um dólar o galão“
- Inhabitat
- Engadget
Imagens: NASA, Inhabitat, JAXA.