Estudo mostra que apenas seis empresas abertas, de um total de 45, apresentam lucro operacional que compensa o custo de capital.
Apesar do bom desempenho das ações em bolsa e dos lucros crescentes, são poucas as empresas que realmente criam valor ao acionista. É o que mostra uma pesquisa do professor da Fundação Getúlio Vargas, de São Paulo – FGV-SP –, Oscar Malvessi, com 45 empresas privadas de capital aberto, entre os anos de 2000 e 2003. Delas, apenas seis – 13% do total – criaram valor ao investidor. A boa notícia é que o número, apesar de ainda ser muito baixo, evoluiu nos últimos anos.
No levantamento anterior, entre 1995 e 2000, somente cinco empresas geraram valor. A conta, desenvolvida por Malvessi para sua tese de doutorado e batizada por ele de Valor Econômico Criado – VEC – é uma relação entre o lucro operacional da companhia e o custo de capital.
Esse lucro é o resultado das receitas menos as despesas, ou seja, o que realmente a empresa ganhou com o negócio, sem contar aplicações financeiras ou vendas de ativos, por exemplo. Já o custo de capital é quanto o investidor precisa ganhar na ação para superar o que ele obteria aplicando o dinheiro em juros, o chamado custo de oportunidade. Essa conta é alta no Brasil em virtude da elevada taxa de juros.
O cálculo é simples, o lucro operacional dividido pelo custo de oportunidade. Se o resultado for maior que um, significa que o lucro é suficiente para remunerar o capital aplicado pelos acionistas. Isso mostra que o resultado da companhia compensa o investimento, e ainda é superior ao retorno que o investidor teria aplicando na taxa de juros. Os cálculos tradicionais para medir o retorno com ações consideram apenas o custo de capital de terceiros, como os empréstimos tomados pela empresa, mas deixa de fora o custo do acionista. Esse custo, segundo o professor, é importante mensurar, principalmente no Brasil, onde os ganhos na renda fixa são altos. Só o custo de capital do acionista varia entre 14% a 16% ao ano, dependendo de fatores como setor a que pertence a empresa, perfil das vendas – quanto no Brasil e quando de exportação – e a estrutura do capital – relação entre capital próprio e dívida.
Pelo estudo de Malvessi, entre 2000 e 2003, apenas Souza Cruz, Metal Leve, Weg, AmBev, Embraco e Lojas Americanas criaram valor ao acionista. A vencedora é a Souza Cruz, com um VEC de 1,91 vezes. Em outras palavras, o lucro operacional da empresa é 91% maior que o custo de capital.
Esse lucro chega às mãos dos acionistas sob a forma de dividendos e da valorização das ações em bolsa. A Metal Leve é a segunda que mais gerou valor, com lucro 64% superior ao custo de capital, seguida pela Weg – 51% – e AmBev – 28%. O lucro da Embraco e das Lojas Americanas praticamente empatam com o custo de capital. Em termos de volume financeiro, a vencedora é a AmBev, que agregou R$ 2,147 bilhões de valor. Segundo Malvessi, a empresa com o maior VEC em volume, não necessariamente é a que proporciona maior valor, já que a cifra depende do tamanho da empresa e do seu lucro.
No levantamento anterior, entre 1995 e 2000, cinco empresas geraram valor ao acionista, entre elas, novamente Souza Cruz, em primeiro lugar, com lucro 62% acima do custo de capital, em seguida Weg – 29% – e AmBev – 19%. Na visão de Malvessi, as três empresas possuem uma gestão de qualidade e consistente ao longo dos anos. Elas também têm em comum uma estrutura de capital enxuta, o que não acontece na maioria das empresas. As companhias são inchadas, com uma grande quantidade de ativos, inclusive imobilizados, comprometendo a eficiência.
O VEC, como mesmo lembra o seu criador, é uma tropicalização do EVA, que em inglês significa Economic Value Added, ou seja, Valor Econômico Agregado. Segundo o chefe de análise do banco Pactual, Ricardo Kobayashi, diferente de outros indicadores, como preço da ação sobre o lucro – P/L – ou valor da empresa sobre sua geração de caixa – EV/Ebitda –, o EVA é o único que mostra a eficiência da gestão no negócio, ou seja, o lucro operacional, e se isso é suficiente para remunerar o capital. Ele lembra que mensurar essa relação é ainda mais importante em países como o Brasil, em que o custo de capital de terceiros – empréstimos e financiamentos – é alto e pode comprometer a eficiência.
Na visão do diretor da Modal Asset Management, Alexandre Póvoa, a vantagem do EVA é que considera o lucro operacional, enquanto que outros indicadores usam lucros contábeis que podem estar contaminados por contas que não necessariamente representam dinheiro no bolso da empresa. Ele lembra, no entanto, que o indicador é falho no trabalho de análise de empresas novas, que geralmente estão fazendo investimentos pesados e não apresentam lucros. O EVA de uma empresa nova pode ser baixo, ou até negativo, sem refletir a sua perspectiva futura.
Entre 2000 e 2003, as seis empresas juntas geraram R$ 4,769 bilhões de valor ao acionista, enquanto que as 39 restantes destruíram R$ 70,380 bilhões. Essa comparação já foi pior. Entre 1995 a 2000, as cinco companhias criaram R$ 3,843 bilhões aos acionistas, frente a uma destruição de R$ 72,961 bilhões.
O professor Malvessi lembra que 27 das 45 empresas analisadas melhoraram o retorno sobre o custo de capital entre 10% a 30%, comparando os múltiplos de 1995 a 2000 com aqueles alcançados entre 2000 a 2003. Algumas como Sadia, Bunge e Marcopolo ficaram muito próximas de alcançar um lucro operacional superior ao custo de capital. Segundo Malvessi, essa relação melhorou muito mais pelo aumento do lucro, do que pela redução do custo de capital. As empresas continuam se preocupando com os custos menos do que deveriam, diz o professor.
Já os resultados operacionais melhoraram nos últimos anos, segundo Malvessi, por alguns motivos. Entre eles: aumento das exportações, estabilidade econômica, crescimento interno juntamente com as economias internacionais e maior profissionalização.
Apesar da evolução, o cenário ainda está muito longe do ideal. Segundo o professor, pelo menos 40% das empresas deveriam gerar valor ao acionista, e não apenas os 13% atuais. Para Malvessi, é uma ilusão estimar quanto o acionista tem de retorno olhando apenas para o lucro líquido da companhia.
Quem cria Valor ao Acionista: relação entre lucro operacional e o custo do capital – VEC
Período de 2000 a 2003
Empresa VEC (em vezes) Geração de Valor
(em R$ milhões)
Souza Cruz 1,91 1.880
Metal Leve 1,64 259
Weg 1,51 472
AmBev 1,28 2.147
Embraco 1,01 10
Lojas Americanas 1,00 1
Quadro Geral Número de
Empresas Geração de Valor
(em R$ milhões)
Nº de cias que geram valor 6 4.769
Nº de cias que destroem valor 39 -70.380
Total 45 -65.611
Fonte: Oscar Malvessi
Período de 1995 a 2000
Empresa VEC (em vezes) Geração de Valor
(em R$ milhões)
Souza Cruz 1,62 2.129
Weg 1,29 323
AmBev 1,19 1.157
Distribuidora Ipiranga 1,11 78
Globex 1,09 156
Quadro Geral Número de
Empresas Geração de Valor
(em R$ milhões)
Nº de cias que geram valor 5 3.843
Nº de cias que destroem valor 40 -72.961
Total 45 -69.118
Fonte: Oscar Malvessi
Investidor dá mais atenção ao conceito
Os investidores já dão maior importância às empresas que criam valor ao acionista e pagam mais por seus papéis. É o que mostra o Valor Adicionado pelo Mercado – VAM –, um cálculo desenvolvido pelo professor Oscar Malvessi e que permite estimar o adicional pago pelos aplicadores em troca da geração de valor, o VEC. Entre as oito empresas que em 2003 tinham esse adicional em seus papéis, cinco haviam agregado valor ao acionista entre 2000 e 2003. São elas: Souza Cruz, AmBev, Weg, Lojas Americanas e Metal Leve.
O VAM vai além da conta tradicional de valor de mercado da companhia, que é o preço da ação multiplicado pelo número de papéis da empresa. Ele é o valor de mercado menos o patrimônio líquido atualizado. Em outras palavras, é o quanto a empresa vale no mercado, sem considerar o capital investido pelo acionista. O professor Malvessi lembra que muitas vezes uma empresa tem um valor de mercado grande, mas isso graças ao seu patrimônio, e não porque suas ações estão valorizadas.
Quando o VAM é maior que 1 significa que o valor de mercado da empresa é superior ao seu patrimônio líquido. Pelo estudo de Malvessi, em 2003, a Souza Cruz era a empresa com maior VAM – 3,54 vezes, ou seja, o seu valor de mercado é 254% superior ao seu patrimônio. Para Malvessi, não é coincidência o fato de a Souza Cruz também ser a companhia que mais gerou valor ao acionista entre 2000 e 2003. O investidor está começando a prestar atenção no conceito de criação de valor, diz.
Entre as 45 empresas analisadas, só oito apresentaram Valor Adicionado pelo Mercado maior que o patrimônio e juntas criaram R$56,737 bilhões de valor. Em 2000, foram apenas cinco empresas, com VAM total de R$27,261 bilhões. Entre elas, novamente Souza Cruz, AmBev e Weg. – D.C.
Valor Adicionado pelo Mercado – VAM
Período de 2003
Empresa VAM
(em vezes) VAM
(em R$ milhões)
Souza Cruz 3,54 6.412
AmBev 3,04 18.007
Lojas Americanas 2,29 1.091
Weg 2,25 1.616
Vale do Rio Doce 1,73 26.504
Aracruz 1,38 2.585
Metal Leve 1,11 91
Pão de Açúcar 1,06 432
Quadro Geral
Número de
Empresas VAM
(em R$ milhões)
Nº de cias c/ VAM positivo 8 56.737
Nº de cias c/ VAM negativo 37 -64.259
Total 45 -7.523
Fonte: Oscar Malvessi
Período de 2000
Empresa VAM
(em vezes) VAM
(em R$ milhões)
AmBev 3,58 19.371
Globex 2,44 1.527
Pão de Açúcar 1,90 5.367
Souza Cruz 1,32 788
Weg 1,22 207
Quadro Geral
Número de
Empresas VAM
(em R$ milhões)
Nº de cias c/ VAM positivo 5 27.261
Nº de cias c/ VAM negativo 40 -73.766
Total 45 -46.506
Fonte: Oscar Malvessi
Fonte
CAMBA, Daniele. Criação de Valor. Valor Econômico. São Paulo e Rio de Janeiro, 17, 18 e 19 dez. 2004. Eu & Investimentos. D1.
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