“A sabedoria é sempre limitada, mas a estupidez é infinita”. A frase é atribuída a Einstein, Hubbard, Roberto Campos e Nelson Rodrigues. De fato, qualquer um deles poderia perfeitamente tê-la dito. É uma verdade tão evidente, especialmente aqui em Pindorama, que deveria ser colocada à vista de todos, para que os representantes do povo jamais se esquecessem dela.
Malgrado tenhamos uma das legislações trabalhistas mais anacrônicas e contraproducentes do universo, e estejamos em meio a uma intensa campanha da sociedade em prol de reformas que desonerem as relações trabalhistas e tornem mais simples os procedimentos, a Justiça do Trabalho tupiniquim acaba de aprontar mais uma.
Empresas do Espírito Santo terão que explicar os motivos para demitir um trabalhador quando a rescisão contratual for questionada na Justiça. Caso não consigam provar a finalidade do desligamento, as corporações podem ter que reintegrar o ex-funcionário ao quadro laboral e ainda pagar os salários e benefícios retroativos.
O plenário do Tribunal do Trabalho da 17ª Região, o TRT-ES, foi o primeiro do país a declarar inconstitucional um decreto do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, publicado em 1996, que liberava as demissões sem justificativa pelos patrões e cancelava os efeitos da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que havia sido ratificada pelo Brasil por meio de decreto legislativo em 1992.
O desembargador do Trabalho, Carlos Henrique Bezerra Leite, explica que a convenção protege o trabalhador de dispensas arbitrárias. “A norma exige que o trabalhador seja tratado com dignidade e obriga a empresa a ter responsabilidade social. O empregado não pode ser apenas o bagaço de uma laranja chupada”, disse, ao defender a medida do TRT: “Qualquer tribunal poderia julgar a constitucionalidade do decreto”.
“O empregador terá que apresentar provas documentais. Acredito que isso vai evitar desligamentos injustificados. Neste período de crise, por exemplo, há empresas que demitem alegando problemas financeiros, mas que apresentam lucros em seus balanços”, diz Leite, ao destacar ainda que a medida vai reduzir os casos de terceirizações fraudulentas, quando um empregado é demitido e contratado como prestador de serviço.
Não por acaso, a famigerada Convenção nº 158, aprovada em 1982, até hoje foi ratificada por apenas trinta e poucos dos 180 países participantes da organização (na sua maioria, subdesenvolvidos, como, por exemplo, Camarões, República do Congo, Etiópia, Gabão, Iêmen, Lesoto, Malauí, Macedônia, Marrocos, Moldávia, Montenegro, Namíbia, Nigéria, Papua-Nova Guiné, República Centro Africana, Santa Lúcia, Sérvia, Ucrânia, Uganda, Venezuela e Zâmbia). Entre os desenvolvidos, apenas seis europeus ocidentais – Espanha, Finlândia, França, Portugal, Luxemburgo e Suécia – e mais a Austrália.
Do ponto de vista prático, se tal disparate for ratificado pelo STF, os benefícios aos empregados serão ínfimos, pois já há na lei de Pindorama incentivos muito mais fortes contra a demissão imotivada, como o aviso prévio e a multa rescisória de 50% do saldo do FGTS. Porém, as conseqüências para o empresário brasileiro serão enormes. A burocracia de uma simples demissão será longa e complexa (muito mais do que já é). Isso encarecerá o trabalho e reduzirá a capacidade de a empresa adequar seu quadro de pessoal às reais necessidades, com a devida agilidade, o que afetará a produtividade e a competitividade.
No mundo globalizado de hoje, em que as empresas precisam competir por mercados mundo afora, muitas vezes brigando com concorrentes localizados em países onde a flexibilidade da legislação trabalhista é imensa e a burocracia reduzida, a aprovação dessa medida é absurda, para dizer o mínimo. O Brasil já “produz” atualmente cerca de 3 milhões de ações trabalhistas, em média, por ano. Só para se ter uma idéia, os Estados Unidos têm perto de 75 mil apenas. Agora, imaginem a confusão que não irá instalar-se na já entulhada Justiça Trabalhista, se uma coisa dessas for adiante.
Ademais, os desembargadores que aprovaram tal medida podem entender muito de direito, mas não sabem absolutamente nada de economia política. Senão, saberiam que progresso econômico e destruição de emprego andam de mãos dadas. Como ensina o professor Richard McKenzie, nenhum país pode se dar ao luxo de pagar salários a uma população ociosa. Da mesma forma que nenhum país pode dar ao luxo de tratar os empregos como se fossem barras de ouro, que devem ser contadas, armazenadas e protegidas da obsolescência.
Não à toa, a criação de emprego (ou proteção dos empregos existentes) costuma ser a meta preferida dos políticos e dos idealistas de plantão, porque apela a interesses concentrados e é sedutoramente enganosa, embora contraproducente. É também um dos objetivos mais fáceis de alcançar. Para criar ou proteger empregos, tudo que se tem a fazer é obstruir o progresso e/ou retardar a competitividade e o espírito empreendedor.
Infelizmente, além da malfadada decisão do TRT, temos outros exemplos recentes – e não só em Pindorama – desta tentativa absurda de fazer parar a roda do progresso. Basta olhar para as cidades que insistem em proibir o Uber (e seus congêneres) a fim de limitar a concorrência e proteger os táxis. Ou as propostas do notório Donald Trump para proteger os empregos americanos com políticas e tarifas de comércio protecionistas, algo que Adam Smith já demonstrou ser um despautério há 250 anos.
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Por João Luiz Mauad, publicado pelo Instituto Liberal