Tenho o costume de ler livros muito lentamente. Quem convive comigo acha incrível a maneira como “mastigo” o mundo ao mesmo tempo que nota que eu, fazendo isso, reflito durante muito tempo sobre o que consumo. Talvez esta seja uma coisa de quem gosta das palavras e gosta de escrever. Não sei. Acontece que ultimamente estou lendo três livros desta forma “mastigada” porque ambos possuem no seu interior, os mesmos ensinamentos sob pontos de vista diferentes e me fazem crer que estou 90% errado sobre tudo o que penso e imagino sobre o mundo. Mais do que levar o leitor a chegar nas mesmas conclusões, acredito que compartilhar esse assunto aqui, me fará perceber ainda melhor as coisas que tenho lido e, consequentemente me permitir mastigar ainda mais estas novas conclusões.
A FUNÇÃO DA LINGUAGEM
Segundo o livro The Trivium, a função da linguagem é comunicar o pensamento, a vontade e a emoção. Concentrando-se somente nesta afirmação podemos notar que a função da linguagem não é comunicar o pensamento OU a vontade OU a emoção, mas sim comunicar o pensamento E a vontade E a emoção. Logo, uma boa comunicação se torna efetiva quando conseguimos transportar nossos pensamentos, nossas vontades e nossas emoções para quem recebe a nossa comunicação. Sendo assim, a função da linguagem é tornar nossas abstrações claras o suficiente para permitir que as cousas da nossa alma permaneçam intactas ao serem transformadas em símbolos (letras, palavras, frases, discursos) e transportadas através destes para os receptores da nossa comunicação, gerando com eficácia impressões na alma destes para interpretarem o mesmo da realidade que nós interpretamos.
AS FUNÇÕES DA MENTE
Duas são as funções básicas da mente: o consciente e o subconsciente, conforme explica o livro Liberte seu Poder Extra. O consciente está intimamente relacionado com a atenção, enquanto o subconsciente é o agente da nossa vida. Onde está a nossa atenção é onde está a nossa consciência e o que fazemos automaticamente sem atenção é onde prevalece o nosso subconsciente. O subconsciente é um robô automatizado para realizar as ações (desde as mais abstratas às mais concretas) sem requerer que prestemos atenção a elas. Respirar, andar, impulsionar o sangue pelas veias e artérias do corpo são ações controladas pelo nosso subconsciente, enquanto escrever, desenhar e criar uma nova estratégia de vendas são ações executadas pelo nosso consciente economizando recursos do nosso cérebro através de algumas sinapses já automatizadas.
A FUNÇÃO DA DISCUSSÃO
Ao contrário do que a nossa vã ignorância possa imaginar, a função da discussão não é chegar na verdade. É fazer com que a verdade seja a verdade que nós estamos propondo como verdade. A dialética erística é a arte de discutir, mais precisamente, a arte de discutir de modo a vencer, como demonstrado no livro Como Vencer um Debate sem Precisar Ter Razão. Se dois oradores debatem sobre um determinado tema onde um defende uma tese e outro a combate, por mais que o combatente demonstre para o defensor que a tese defendida possivelmente está incorreta, o defensor fará uso de estratégias para desarmar o combatente de seus argumentos para sair vitorioso do debate independente da sua tese ser a correta ou não. Donde provém isso? Da perversidade natural do ser humano, segundo Schopenhauer. Se esta perversidade não existisse, se no nosso fundo fôssemos honestos, em todo debate tentaríamos fazer a verdade aparecer, sem preocupar-nos com que ela estivesse conforme à opinião que sustentávamos no começo ou com a do outro; isto seria indiferente ou, em todo o caso, de importância muito secundária.
Nós economizamos energia automatizando processos provavelmente errados de certezas que conservamos para demonstrar a todo momento que nós estamos certos e que o mundo está errado.
Como pertencemos a natureza, economizamos a todo momento energia, mantendo nossas sinapses com as certezas que já acumulamos (mesmo que incorretas). Defendemos estas certezas para nós e para os outros reforçando os laços do nosso sistema de crenças fazendo mau uso da linguagem na criação de símbolos abstratos indevidos (letras, palavras, frases e discursos). Automatizamos o nosso robô para pensar da mesma forma sempre, mais rápida e automatizada cultivando uma vida compromissada com a mentira.
Falar que não vamos conseguir algo ou que tal coisa é impossível é um discurso automático fixado nas sinapses do nosso cérebro para que nós nos mantenhamos vivos da mesma forma que estamos vivos até aqui sem qualquer compromisso em pesquisar se isto que automatizamos está certo ou errado.
Meu trabalho neste pequeno artigo não foi confirmar uma certeza, mas levantar uma dúvida. Levantar a dúvida de que possivelmente tudo o que pensamos sobre tudo possa estar definitivamente incorreto e que na verdade não temos limites ao contrário do que nos impomos. Nos limitamos nas ações, no uso do dinheiro, no aprendizado de novas ciências, quando na verdade somos em potência à imagem e semelhança de um ser mitológico com todas as potências desenvolvidas que a maioria das religiões chamam de Deus. Se temos o potencial para nos tornarmos deuses e imortais, porque não automatizar nosso simples artefato material para atingir esta plenitude ao invés de mantê-lo preso às suas limitações?
Instaurada a dúvida, encerro-me.