Imagine: você foi levado às pressas para o pronto-socorro e está morrendo. Seus ferimentos são graves demais para os cirurgiões tratarem a tempo. Seus vasos sanguíneos sangram em hemorragias invisíveis. A perda de sangue está matando seus órgãos pela falta de nutrientes e oxigênio. Você está entrando em parada cardíaca.
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Mas não é o fim. Toma-se uma decisão: você é ligado a tubos, os médicos ativam uma máquina, e um mecanismo de bombeamento começa a ir para frente e para trás. Um líquido frio como gelo corre em suas veias, resfriando-as. Logo seu coração para de bater, seus pulmões já não respiram. Seu corpo gelado fica lá, equilibrado na fina linha entre a vida e a morte, nem totalmente de um lado nem do outro, como se parado no tempo.
Os cirurgiões continuam a trabalhar, pinçando, suturando, consertando. O mecanismo de bombeamento então volta à atividade, trazendo o sangue quente de volta para seu corpo. Você vai ser ressuscitado. E, se tudo correr bem, você vai viver.
Animação suspensa
A animação suspensa, a habilidade de colocar os processos biológicos de uma pessoa em modo de espera, é conhecido há tempos na ficção científica. O interesse nessa área cresceu nos anos 1950 como uma consequência direta da corrida espacial. A NASA financiou pesquisas biológicas para ver se humanos poderiam ser postos em um estado de preservação artificial. Nesse estado, esperava-se, astronautas poderiam ser protegidos da perigosa radiação cósmica que permeia todo o espaço. E, ao dormir rumo ao espaço, astronautas precisariam levar menos comida, água e oxigênio, tornando mais práticas as viagens realmente longas.
Um dos destinos desse financiamento foi o jovem cientista James Lovelock. Ele mergulhava hamsters em banheiras geladas até que seus corpos congelassem. Quando o cientista não mais detectasse os batimentos cardíacos, ele os reanimava colocando uma colher quente contra o peito do hamster. (Lovelock também fez experimentos ainda mais ao estilo era espacial, usando partes de um rádio para construir uma pistola de microondas, para reviver suas cobaias com mais cuidado.) Esses experimentos com a flexibilidade da vida o colocariam no caminho de seu trabalho mais famoso, a “hipótese de Gaia”, que apresenta o planeta como um super-organismo vivo.
Apesar de ousados, esses experimentos iniciais não passaram dos testes em animais, e astronautas nunca foram congelados e revividos com colheres quentes. A ideia de transformar pessoas em picolés de carne para uma viagem espacial de longa distância continuou no reino da ficção científica. O interesse da NASA aferreceu com o fim da corrida espacial, mas as sementes plantadas por Lovelock e seus colegas continuaram a crescer.
Humanos congelados
Em 1900, o British Medical Journal publicou um relato de camponeses russos que, segundo o autor, eram capazes de hibernar. Moradores da região nordeste de Pskov viviam em um estado próximo à fome crônica, e se fechavam em casa ao primeiro sinal de neve: eles se juntavam ao redor do fogão e caíam em um sono profundo, que chamavam de “lotska”. Acordando uma vez por dia para comer um pouco de pão e tomar água, os membros da família se revezavam em turnos para cuidar do fogo, só acordando por completo quando chegasse a primavera. Nenhum rastro dos camponeses sonolentos de Pskov foi encontrado desde então, mas a fantasia da hibernação humana persiste e, de vez em quando, algo que se parece muito com isso surge na vida real.
Um século depois, Anna Bågenholm estava em férias, esquiando na Noruega, quando caiu de cabeça em um rio congelado e ficou presa sob o gelo. Quando o resgate finalmente chegou, a radiologista sueca tinha ficado submersa por 80 minutos – seu coração e sua respiração tinham parado. Os médicos do Hospital Universitário de Tromsø registraram a temperatura corporal dela em 13,7°C, a mais baixa observada em uma vítima de hipotermia acidental. Para todos os efeitos, ela parecia ter se afogado. No entanto, depois de um cuidadoso reaquecimento e dez dias na unidade de tratamento intensivo, Bågenholm acordou. Ela se recuperou quase completamente de sua fria batalha com a morte. Sob circunstâncias normais, mesmo alguns minutos sob a água é suficiente para afogar alguém, mas ainda assim Bågenholm sobreviveu por mais de uma hora. De alguma forma, o frio a manteve viva.