Antes de começar a ler, saiba que esse texto é um lembrete do que já passamos em um mercado tão novo e que já estamos repetindo erros do passado ao sobrecarregarmos determinadas funções.
É uma homenagem a galera da primeira geração desse mercado. Pessoas como Alexandre Inagaki, Wagner “Mr Manson” Martins, Gustavo Fortes, Pedro Ivo Resende e mais um monte de gente que acreditou nisso tudo desde cedo e, aprendendo enquanto fazia, errando e acertando muito, ajudou a construir um mercado.
O tom é pessimista justamente por notar erros sendo repetidos. Notar que são poucos os que sabem ouvir o que uma comunidade diz e realmente utilizar essas informações, já que continuamos usando Bradesco e o Pinguim do Ponto Frio como Benchmark de Gestão de Comunidade feita por marcas. Esse tom pessimista é para incomodar. Esse tom pessimista é para vocês mostrarem que há luz no fim do túnel e colocarem bons casos brasileiros nos comentários. Esse tom pessimista é um desafio.
Então chega de blá-blá-blá e vamos ao texto.
O COMEÇO
É curioso pensarmos em como o cenário nos viciou na idéia de que quem trabalha com Social Media tem que saber de tudo. Tem que saber de conteúdo, de programação, de SEO, de Mídia, de BI e o que mais quiser colocar nesse saco.
Os tais analistas de redes sociais nasceram dessa forma no Brasil. Na primeira geração de pessoas que trabalhavam com redes sociais, e com isso eu quero dizer comunidades do Orkut, blogs e, de vez em quando, fóruns. Na verdade, o termo redes sociais nem era usado ainda, então imagine como podia ser difícil achar pessoas para trabalhar nesse cenário.
Foi então que tiveram que inventar um cargo para o blogueiro: Analista de Redes Sociais
Comprar publieditorial ainda era uma polêmica e muitas coisas que hoje temos como claras e definidas, simplesmente não existiam. Blogueiros pareciam uma opção que fazia sentido para esse trabalho. Quer saber porque? Aqui vai:
Eles começaram fazendo seus blogs porque queriam escrever sobre assuntos que gostavam. As pessoas passaram a gostar do que esses blogs publicavam, e aí o blogueiro ficou curioso para ver o que atraía mais essa galera que vinha do Google. Começou a brincar com títulos diferentes e com mais apelo para ter melhor posição no mecanismo de busca e ser mais visto, mudou o layout da página e para isso teve que aprender noções de HTML e talvez de Photoshop.
Quando notaram que tinha muita gente comentando no blog, resolveram entender melhor quantas pessoas estavam acessando, de onde vinham, como se reproduziam e tal. Com cada vez mais pessoas lendo, escrever no blog tomava muito tempo da vida deles, e a audiência até cobrando posts com mais frequência. Estava então na hora de tentar ganhar algum dinheiro com isso, colocando uns links de afiliados da Amazon, Mercado Livre, Google Ads, e afins.
Quando algumas agências descobriram que essas pessoas comuns as vezes influenciavam mais do que os grandes veículos para determinados públicos, resolveram comprar espaço comercial e editorial nesses blogs. Mas com esse novo mercado que abriu, vieram métricas da mídia online tradicional: pageviews, impressões e etc.
Analisando o parágrafo acima, dá para notar que o tal blogueiro tinha uma porção de funções diferentes. E isso é ótimo para eles, mas não necessariamente para as empresas que os contrataram depois. Seu conhecimento, embora útil em um primeiro momento, acaba sendo superficial. Funciona, mas apenas em um curto prazo.
Há profissionais especializados e que vão cumprir essas funções melhor que blogueiros em boa parte das vezes. E isso não é um demérito. É apenas uma constatação de que os blogueiros, assim como qualquer profissional, vão se dar melhor em algumas funções do que em outras, e o seu gestor deveria notar isso e tentar aproveitar o melhor daquela pessoa. Infelizmente não é isso que acontece. E não foi o que aconteceu por um simples motivo: as agências não estavam preparadas para alguém com aquele perfil.
O blogueiro era um redator, mas não redator publicitário, ele sabia alguma coisa de Analytics mas não tinha a bagagem de estatística, sabia mexer em templates de blog mas não era programador e por aí vai.
Naquele tempo, a maior parte das ~ações~ era no Orkut e em blogs, então esse blogueiro, virou o ~cara do Orkut~ e o que ele fazia era gestão dessas comunidades proprietárias (da marca ou da ação), negociando com os outros blogueiros. Só que as pessoas foram migrando para outras ferramentas como Flickr, Facebook, MySpace, etc, e esse cara continuou tocando essas coisas porque eram mais próximas do seu universo do que o do povo que fazia sites em flash.
Foi então que tiveram que inventar um cargo para esse cara: Analista de Redes Sociais. E aí todo esse conhecimento pela metade que ele tinha virou função do cargo. Claro que isso ia dar errado. E deu. A complexidade do trabalho aumentou muito com a expansão desse ecossistema.
O INÍCIO DA MUDANÇA
Vários Analistas de Redes Sociais mais safos começaram a crescer na agência e, com isso, passaram a desprezar o cargo anterior. Vários deles que se destacavam no ambiente de agência, viraram estrategistas digitais, começaram a falar de ecossistema da marca e se aproximar do planejamento.
Outros viram que a área de conteúdo tinha mais a ver com eles e começaram a focar nisso, mas com uma visão de marca que reforçasse o Brand Persona. As coisas pareciam ter melhorado. As agências entenderam melhor o que eram as redes sociais, encergando que conteúdo e comunidade são coisas importantes (e fundamentais) para qualquer marca que quiser se aventurar em social media.
Mas quando começou a guerra por quantidade de fãs e seguidores, e as marcas viram que isso só tornava tudo ainda mais complicado e dava trabalho, eles, os analistas de redes sociais, viraram mais necessários do que nunca. Dessa forma, o termo foi atualizado em boa parte das agências sérias para Community Manager. Resultado: ele já não era mais responsável por tudo.
Agências entenderam que conteúdo e comunidade são fundamentais para qualquer marca que quiser se aventurar em social media
O profissional começou a se especializar em entender como aquela comunidade funcionava, o que gerava mais participação e menos rejeição, começou a detectar padrões entre os comentários, notar quais eram os mais fãs/seguidores mais ativos e por aí vai. E aí vieram os novos problemas: uma herança maldita dos primeiros anos de trabalho em redes sociais, as agências começaram a se perguntar o que essa pessoa fazia. Porque, aparentemente, ela não faz nada além de passar o dia nas redes sociais.
MUDOU. MAS NÃO MUITO.
O cargo continuava bastante operacional, é claro, e o fato de tratarem esses profissionais apenas como um SAC online só complicou. Com algumas exceções, essa pessoa só era acionada quando havia algum problema. Nunca eram chamados antes da nova campanha ~incrível~ da agência ir para rua. E se os produtos/serviços da marca não eram bem vistos pelo público então, dava até pena dos Community Managers.
O que está acontecendo com os Community Manager é exatamente o que ocorre com o a equipe de Telemarketing: São sempre os últimos a saber
Em várias agências já vemos duplas exclusivas para criação em Redes Sociais. BI se tornou cada vez mais importante tanto para resultados das ações quanto para o planejamento e criação. Mas o Community Manager continua sozinho publicando e agendando posts, sempre alerta para as interações que deve responder. Ele é tratado como um pária.
Outra função do Community Manager que também é ignorada é a curadoria. Por estar sempre atento ao que acontece nos canais sociais da marca, volta e meia ele tem acesso a notícias ainda não divulgadas amplamente, assuntos relacionados aos temas da marca e isso acontece tanto que nem sei como temos tão poucos casos a respeito.
Por que ninguém divulga esse tipo de informação? É uma maneira de valorizar o trabalho do Community Manager, de mostrar que a sua agência/marca realmente ouve e analisa o que está sendo falado a seu respeito e reage de acordo.
No final das contas, eu acho engraçado que todas as agências e empresas coloquem no seu método que ouvem o que a audiência fala, e que usam isso para alimentar o conteúdo criado. Mas, quando analisamos a fundo, isso não acontece com essa frequência. Tem muita informação ruim nas redes sociais a respeito das marcas. E é difícil conseguir separar o joio do trigo, principalmente quando falamos de uma marca grande. Uma marca deveria estar a par de coisas que acontecem no seu mercado, certo? Pois nem sempre isso acontece.
O papel do curador é exatamente esse. Separar o que é bom do que é ruim e comunicar a todos. Não no relatório semanal ou mensal, mas o quanto antes. Em Social Media o timing é importante. Ter algo novo para divulgar ou uma visão nova a respeito de um assunto pode ajudar a construir a marca.
Mas como avaliar o trabalho e a importância de um Community Manager se o espaço dado a essa pessoa é restrito? É enorme a quantidade de vezes que eu vi insights achados por eles serem ignorados pela Criação e pelo Planejamento. Não adianta continuar a tratar Community Managers “como as pessoas responsáveis por publicação de posts” ou como SA.
Que tal envolver essas pessoas no processo todo? O que está acontecendo com os CMs é exatamente o que ocorre com o a equipe de Telemarketing. São os últimos a saber, são apenas operacionais e só são ouvidos quando dá algum problema.
O CÍRCULO VICIOSO
Até quando? O que acontece hoje é que entramos em uma círculo vicioso. Community Managers que não são ouvidos, começam a não falar mais e apenas fazem o que é mandado, cansam desse tipo de trabalho e vão buscar outra coisa. O turn-over aumenta e acham que o problema é do cargo que é chato e entediante.
Talvez esteja na hora de começarmos a dividir ainda mais as funções e as equipes: SAC, Conversação e Conteúdo
Na verdade, chato é que boa parte das empresas reduzem o cargo apenas a parte operacional. Contratam pessoas formadas, com inglês fluente para ficar olhando post de gente que mal sabe escrever em português.
Ou seja, no cenário atual não estamos criando um olhar estratégico para os Community Managers. Estamos replicando o modelo criado pelas empresas de Telemarketing para atender as dúvidas e reclamações dos clientes e, isso, mesmo sendo feito online, é um serviço diferente. Algo que muitas vezes acaba sendo feitos pelo Community Manager, mas ele tem muito mais coisa para acrescentar para a estratégia da marca.
SERIA A HORA DE UM NOVO REBOOT?
Então agora releia o primeiro parágrafo desse texto e note que estamos fazendo a mesma coisa com os Community Managers. Eles tem que saber gerenciar a comunidade, analisar tendências, buscar insights dos assuntos relacionados e ainda responder todas as interações nos perfis sociais. Menos, gente. Menos.
Talvez esteja na hora de começarmos a dividir ainda mais as funções e as equipes: SAC, Conversação e Conteúdo.
SAC fica responsável pelas dúvidas e respostas relacionadas ao produto/serviço. Um outro time, focado em Conversação deve analisar tendências, buscar insights e manter contato com as pessoas que publicam algo sobre a marca, mas que não necessariamente exigem uma resposta, tendo também um outro time separado para focar em conteúdo e que seria alimentado de informações pelas outras duas áreas.
E nesse cenário, quem sabe não vale dividir também as empresas responsáveis por essas entregas? Empresas especializadas em SAC Online, empresas especializadas em geração de conteúdo e um ou dois Community Managers trabalhando de dentro do departamento de marketing e não nas agências e que sejam responsáveis por integrar essas outras duas empresas especializadas.
Enfim, são apenas devaneios de um velho nesse mercado, aflito com o cenário atual e que está torcendo para que tudo mude de novo.
/Animação e GIF’s: Onward Internet e Buck
Post originalmente publicado no Brainstorm #9
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