É interessante observar como essas eleições presidenciais estão sendo para a comunicação e como a gente tem se comportado diferente esse ano. Esse é o único post que me permito fazer sobre o tema (me segurei por meses até agora), por questões éticas: durante o primeiro turno trabalhei diretamente com a coordenação online de uma dessas campanhas. Optei, por razões minhas, por não fazer o segundo turno e, de férias, deixei de acompanhar de perto.
Disclaimer feito, aqui vão algumas observações e pensamentos, baseado no que acompanhei nos últimos anos e agora:
Todo mundo apostava que essa eleição seria decidida pela web. Os indícios eram claros: web (sobretudo mobile) mais popular do que nunca; benchmark do Obama e o case de sucesso da Marina Silva na Eleição de 2010.
Os partidos e os partidários se armaram pra isso, direta e indiretamente. Virou guerra, com “facções” de militantes (por conta própria ou não). Alguns famosos, como a Dilma Bolada, outros invisíveis no WhatsApp circulando boatos. Mas uma coisa é clara: as guerrilhas de ataque na internet ficaram tão, mas tão escancaradas que um canal oficial como o MudaMais não soa tão agressivo quanto seria em 2010.
Outra aposta geral, essa sim, se concretizou: nesse ano, a eleição não tinha espaço para muita proposição. Era de destruição mesmo.
Nunca teve tanta informação circulando: falsa, verdadeira, parcialmente verdadeira, absurda, coerente; de imprensa, de páginas que emulam ser imprensa, de usuários normais, de canais oficiais dos partidos, de canais coligados, de canais sem nenhuma ligação, da página do seu primo coxinha ou descolado.
Só se fala disso na web, mas fala-se demais e ninguém consegue ter uma noção verdadeira do que acontece: é meme (um fenômeno que faz, sim, a gente mudar o sentimento sobre o personagem)? é boato? é mentira? é verdade? é confiável? é guerrilha? é a informação mais atualizada? é oficial?
Com tanta opinião sem fundamento, com tanta mentira misturada à verdade, com tanta piada em cima de notícia, como definimos nossa percepção, razão e consequente voto?
De modo mais claro, até a TV e os palanques dos partidos foram mais usados ainda para disseminar informações – verdadeiras ou não. Daí vem os sites jornalísticos lançando espaços exclusivos para dizer o que é verdade e o que é mentira; as campanhas lançando espaços para se defender dos boatos; sites e apps tentando organizar as informações.
Descobrimos, também nessa eleição, algo tão óbvio que surpreendentemente gente bem informada não percebeu: nossas redes sociais só refletem a gente mesmo (e a gente não é tão bem informado assim sempre). Não é pra isso que é feito o algorítimo de tudo? Pra ser relevante PRA GENTE?
Sim, pela timeline de todos nós, nesse círculo (sábio Google+) que estamos, a Luciana Genro iria pro segundo turno e era a heroína (junto com o Eduardo Jorge, claro). Todo nosso círculo defende essas pautas progressistas – eu também, é óbvio. Não defende, entretanto, ideias socialistas (que causariam pânico na galera da bike importada) que estavam lá no programa dela. Mas era mais um canal de informação pra olhar, e a gente já tinha visto TANTA coisa nos debates, entrevistas e nos memes e opiniões gerados depois deles…
Os filtros da imprensa, dos algoritmos e dos nossos amigos e familiares não são mais tão confiáveis
Quantos posts de Facebook (gerais, não só oficiais) suprem a sensação de necessidade de acesso ao programa de governo?
Com tanta informação circulando, com tanta opinião sem fundamento, com tanta mentira misturada à verdade, com tanta piada em cima de notícia, com nossa timeline desmentindo as pesquisas, com a “terceira via” sendo pautada por interesses conservadores, como definimos nossa percepção, razão e consequente voto?
Não acho que essa eleição vá ser vencida na internet, não com a força que poderia. Acho que, da forma como tudo aconteceu, passou do ponto e fez uma outra mídia brilhar novamente: a TV ao vivo.
O debate do primeiro turno da Globo me parece ter sido bem importante pra mudar o cenário da votação que ocorreria poucos dias depois. As pesquisas da última semana já indicavam, pré-debate, quem disputaria o segundo turno. Mas eu realmente acredito que os números tão fortes de Aécio na urnas se devem, em parte, ao bom desempenho dele naquele debate. Todos nós só falamos disso, mas aí que está o interessante: nossas famílias e as famílias dos outros, também.
O primeiro debate da Band no segundo turno teve média de 11 pontos de Ibope, com picos de 13. Três ou quatro vezes a média comum do canal no horário; sua maior audiência no ano, superando até os jogos da Copa. Nunca tinha visto (e eu sou um tanto fissurado por audiência de TV e também por debates) o canal registrar índices tão elevados, muito menos com política.
Por quê? Porque com todo mundo falando, a gente fica mais interessado no assunto. Mas também porque tá difícil confiar no que tão falando pra gente, no que nossa timeline tá mostrando.
Os discursos escritos e conteúdos produzidos pelas candidaturas e os filtros da imprensa, dos algoritmos e dos nossos amigos e familiares não são mais tão confiáveis diante de um tempo de propaganda política tão complexa e multinível.
A gente tem parado em frente à TV para se informar, em plena “era de ouro” da internet. E, de todos os meios, nada mais fácil e instantâneo para formarmos nossa própria percepção e, assim, opinião sobre o candidato e suas ideias do que ver a própria pessoa falando na hora, sem a edição ou o filtro evidente de ninguém (por mais que a preparação preliminar seja absurda).
Pro nosso círculo, talvez seja um “Hum, olha só, nossa percepção de realidade é outra, não dá pra achar que isso é o Brasil, melhor olhar pra fora”. Mas, pra esse tal de Brasil real, creio eu, é muito mais um cenário de “já ouvi falarem tanta coisa que nem sei mais em quem acreditar. Deixa eu assistir pra ver se alguém se salva”.
No fim, são só dois números para serem apertados (além da tecla verde, é claro).
Post originalmente publicado no Brainstorm #9
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