Até 10 anos atrás, a ideia de reverter o envelhecimento e conquistar a mortalidade humana ainda era ciência de fronteira, vista como pesquisa duvidosa pela maioria dos cientistas, grandes empresas farmacêuticas e público em geral. Que diferença uma década faz: a ciência antienvelhecimento está prestes a se tornar uma grande indústria de biotecnologia no mundo.
Para tentar provar essa promessa, foi feita a primeira aposta milionária sobre viver mais tempo. Ela foi divulgada esta semana, porém foi firmada no mês passado por dois principais defensores da longevidade no maior evento anual de investimentos em saúde, a Conferência JPMorgan de Assistência à Saúde.
Um dos envolvidos na aposta é Dmitry Kaminskiy, sócio sênior do Deep Knowledge Ventures, um fundo de Hong Kong para capital de risco em tecnologia. O outro é Dr. Alex Zhavoronkov, Ph.D., CEO da empresa de bioinformática Insilico Medicine, especializada na descoberta e reaproveitamento de remédios para o envelhecimento e doenças relacionadas à idade.
Eles assinaram uma aposta para indicar sua certeza de que a ciência vai virar o jogo contra o eterno problema do envelhecimento humano.
Os termos são estes:
– se uma das partes falecer antes da outra, US$ 1 milhão em ações da Insilico Medicine serão repassados para a pessoa que sobreviver;
– o acordo deixa de valer uma vez que ambas as partes cheguem a 100 anos;
– as partes concordam em não acelerar a morte de outro (ou seja, tentar matar um ao outro).
“Essas competições pela longevidade podem ser uma ótima maneira de combater tanto o envelhecimento psicológico e biológico”, me disse Dr. Zhavoronkov por e-mail. “Espero que comecemos uma tendência.” Ele acredita que mais apostas de longevidade serão firmadas em todo o mundo: se as pessoas entrarem na competição para viver mais tempo, elas podem deixar para trás uma cultura global que, em grande parte, aceita o envelhecimento e a morte humana como um dado.
Kaminskiy concorda. “Eu realmente gostaria de fazer apostas semelhantes com Bill Gates, Elon Musk ou Mark Zuckerberg, para que eles pudessem viver vidas mais longas e criar grandes produtos, mas eu não acho que eles serão concorrentes dignos para a longevidade”, ele me escreveu em um e-mail. “Mas eu gostaria de desafiar Sergey Brin e Larry Page para uma competição semelhante, devido a seu interesse aparentemente grande nos projetos Sphere e Calico”.
A ciência de extensão da vida
Recentemente, vem surgindo bastante atividade no campo da longevidade, também conhecida como ciência de extensão da vida, a prática de tentar encontrar maneiras de impedir o envelhecimento e as doenças. Seus defensores são frequentemente chamados de extensionistas da vida, transumanistas e imortalistas, e eles pretendem viver mais tempo usando descobertas médicas em medicina regenerativa, células-tronco, rejuvenescimento de tecido, reparação molecular, produtos farmacêuticos e até substituição de órgãos.
Segundo a Reuters, o Dr. Aubrey de Grey, gerontólogo biomédico e cientista-chefe da SENS Research Foundation, acredita que cientistas poderão controlar o envelhecimento em um futuro próximo. “Eu diria que, dentro dos próximos 25 anos, temos uma chance 50/50 de trazer o envelhecimento sob um nível decisivo de controle médico.”
Nos últimos dois anos, foram criadas grandes empresas antienvelhecimento. Uma delas é a Calico, do Google. Temos também a Human Longevity Inc., uma startup para sequenciamento de genoma cofundada por Peter Diamandis, da X-Prize Foundation; e Robert Hariri, pioneiro em células-tronco; ela já tem US$ 70 milhões em financiamento. Bilionários como Larry Ellison e Peter Thiel também estão financiando pesquisas na ciência da longevidade.
Há um fluxo crescente de estudos, descobertas e projetos antienvelhecimento que aparecem em revistas científicas e na mídia em geral. “Parece que um novo boom de investimentos está chegando, assemelhando-se o boom dotcom”, Kaminskiy me disse.
Apostando pelo futuro
Será que essa aposta em longevidade é apenas um chamariz, ou pode realmente ajudar a ciência antienvelhecimento? Andrew Garazha, analista na empresa de biotecnologia e medicina regenerativa Aging Analytics, testemunhou a aposta e me contou sobre ela. Ele explica seu significado em um e-mail:
A aposta significa:
1. Estamos muito confiantes de que a expectativa de vida será estendida drasticamente;
2. Competir para a longevidade prevê incentivos extras para cuidar da nossa saúde hoje, e para tentar várias abordagens que estendem a expectativa de vida;
3. Competir pela longevidade fornece motivação extra para viver.
Garazha tem um bom argumento. Historicamente falando, várias competições e apostas foram feitas para promover a ciência e as ambições da humanidade. Napoleão Bonaparte ofereceu 12.000 francos para quem pudesse aprender a conservar alimentos, algo que iria ajudar muito suas campanhas militares distantes. O vencedor foi Nicolas François Appert, cujo método de ebulição e de vedação de alimentos em garrafas em 1809 levou à comida enlatada.
Outras apostas, competições e corridas são bem mais conhecidas: a X Prize Foundation, que promove competições em ciência e exploração espacial; a corrida americana e soviética à Lua durante a Guerra Fria; e até mesmo o supercomputador IBM Deep Blue derrotando Gary Kasparov no xadrez. Esta partida foi inicialmente impulsionada por uma competição, na qual a equipe da IBM ganhou um prêmio de US$ 100.000.
Competições por longevidade podem parecer novas e futuristas, mas têm algum precedente histórico. Um plano de investimento em anuidade moderadamente popular na Europa nos séculos XVIII e XIX, chamado tontines, incentivou uma concorrência para viver mais tempo, pois dava os fundos de investimento dos participantes falecidos aos que ainda estivessem vivos.
Uma aposta de longevidade mais conhecida foi feita por Jeanne Calment, de 90 anos, e o advogado André-François Raffray. O acordo era que Raffray lhe pagaria uma quantia mensal de US$ 500 enquanto ela estivesse viva, mas ele herdaria o apartamento dela depois que ela falecesse. Dada a sua idade avançada, isto parecia ser uma aposta fácil. Mas Calment só faleceu aos 122,5 anos, que até hoje é o recorde confirmado de qualquer ser humano. Ironicamente, Raffray morreu antes de Calment, e acabou pagando o dobro do valor do apartamento.
A aposta entre Kaminsky e Zharvorokov parece uma forma de gerar hype e publicidade para a ciência da longevidade porque é, mesmo. Mas, como muitos outros defensores da longevidade, eles não entraram nessa por dinheiro ou fama. Eles fazem isso por uma razão singular e extremamente humana: eles não querem morrer. E eles querem que os outros saibam que, no século XXI – uma era transbordando com nova ciência radical, medicina e tecnologia – eles talvez não tenham que morrer.
“A tecnologia está evoluindo tão rápido”, diz Kaminskiy, “que eu não tenho nenhuma dúvida de que poderemos viver séculos, em vez de décadas”.
Zoltan Istvan é o autor do livro The Transhumanist Wager e fundador do Partido Transumanista nos EUA.
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