“Quem te influenciou mais na sua vida?”
Essa foi a pergunta que Brandon Stanton fez ao conversar com um dos garotos que havia retratado nas ruas da cidade de Nova Iorque, mais especificamente no bairro do Brooklyn.
“A diretora da minha escola, a senhorita Lopez”, respondeu Vidal, explicando melhor como ela o tinha influenciado. “Quando nós nos metemos em encrenca, ela não dá suspensão pra gente. Ela nos chama na sua sala e explica para a gente como a sociedade foi construída ao redor de nós. E uma vez ela fez cada um dos alunos levantarem, um de cada vez, e disse a cada um de nós que nós éramos importantes”.
Seria apenas mais um relato emocionante da página de fotografias Humans of New York, com mais de 11 milhões de fãs no mundo todo, se não fosse o espírito de Brandon.
O fotógrafo foi até a escola Mott Hall Bridges Academy, para conversar com a senhorita Lopez, continuando a história começada por Vidal, dando um incrível apoio moral para os estudantes.
“Esse é um bairro que não espera muito das suas crianças, então na Mott Hall Bridges Academy, nós temos uma expectativa bem alta. Não chamamos nossos alunos de “estudantes”, mas de “estudiosos”. Funcionários e “estudiosos” usam a cor roxa, porque roxo é a cor da realeza. Eu quero que meus estudiosos saibam que mesmo que eles vivam em um conjunto habitacional, que eles são parte de uma linhagem real que vem dos grandes reis e rainhas africanos. Eles pertencem a um grupo de indivíduos que resistiram tanto historicamente, e que ainda tem tanto para superar. Quando você conta que você é de Brownsville, as pessoas franzem o cenho. Mas existem crianças aqui que precisam saber que acreditamos que elas vão ser bem sucedidas”, foi o testemunho da diretora da escola de Vidal, em foto divulgada há uma semana.
Muitos dos comentários da foto aplaudiam a iniciativa da diretora da Mott Hall Bridges Academy, e então algo muito bacana aconteceu: Brandon liderou uma campanha de financiamento coletivo, para permitir que as crianças da escola tivessem um novo horizonte e uma melhor expectativa de futuro. A ideia era permitir que elas pudessem todos os anos visitar uma das universidades mais famosas do mundo, Harvard.
“Eu quero que todas as crianças que entrarem na minha escola saibam que elas podem ir a qualquer lugar, e que elas vão pertencer naquele ambiente”, explicou a senhorita Lopez.
O resultado foi infinitamente melhor que a encomenda, e mostrou o quanto uma ~simples página de fotografias no Facebook~ pode fazer uma enorme diferença na vida de tanta gente, principalmente entre os humanos que vivem em Nova Iorque: já foram arrecadados mais de UM MILHÃO DE DÓLARES.
UM-MI-LHÃO-DE-DÓ-LA-RES. E a campanha ainda vai rodar por mais uma semana.
Nesses últimos 7 dias, Brandon focou seus esforços fotográficos em contar mais sobre a realidade da escola, suas dificuldades e a beleza da resiliência de seus alunos, dos professores e dos pais das crianças que frequentam a escola.
Eram questões bastante pertinentes a quaisquer iniciativas feitas na periferia – o esforço contínuo, a esperança, o eventual desespero e vontade de desistir, e os pequenos prazeres do cotidiano que os fazem continuar.
“É especialmente difícil quando você volta das férias. Porque você sente que muito do progresso que você tinha feito no último semestre foi desfeito durante as férias. É difícil, muito difícil. E é normal você sentir vontade de desistir. Você pode desistir quando quiser, e eu vou pegar o telefone e recomendar você para um outro trabalho, porque todos vocês podem ser bem sucedidos em qualquer lugar. Mas essas crianças precisam de vocês. Nossas meninas não se sentem honradas e respeitadas. Nossos meninos estão sendo recrutados por gangues. Nossas salas de aula podem ser o único lugar onde eles se sentem seguros e respeitados. Se desistirmos, não haverá mais ninguém a zelar por eles”, diz a diretora Lopez em uma reunião com seus professores.
Os fãs do HONY se emocionaram tanto com a mensagem da diretora Lopez que muitos deles a presentearam com buquês de flores.
O sucesso da campanha de financiamento coletivo foi tamanho, que em 24 horas já era possível garantir que a visita a Harvard fosse parte permanente do currículo da escola. Como as doações continuaram, a diretora da escola e Brandon pararam para pensar o que mais poderia ser feito com aquele dinheiro para continuar a ajudar a escola. Decidiram então que após os 350 mil arrecadados, a cada 40 mil dólares, um ano de programa de férias seria financiado.
Poucos dias depois da primeira fotografia com Vidal, Brandon encontrou com ele novamente e fez um novo retrato. “O que você diria que foi sua maior conquista?”, provocou Brandon, e a resposta foi ainda melhor: “Conseguir visibilidade para a minha escola”
A sensação de “que pessoas incríveis são essas” continuava a cada postagem, em um período que Brandon se dedicou a documentar e divulgar quão visionárias pequenas atitudes da Mott Hall Bridges Academy podiam ser.
“Eu cresci nessa região, e costumava ir de ônibus para a escola, que ficava em um bairro de pessoas brancas. Diversas pessoas naquele bairro ne faziam sentir como se eu não pertencesse àquele lugar. A mensagem que percebíamos era que os negros não eram bem-vindos ali. Mas o diretor da escola era um homem judeu chamado Irving Rahinsky. E todas as manhãs, quando saíamos do ônibus, o Sr. Rahinsky estava de pé na calçada, esperando por nós. Ele apertava nossas mãos quando saíamos do ônibus, e nos fazia sentir realmente parte daquele lugar. Agora que eu sou um professor, eu chego mais cedo todas as manhãs, para que eu possa ficar aqui de pé, oferecendo um aperto de mão e um abraço a cada um dos meus estudantes quando eles chegam”.
“Às vezes, as falhas são tão grandes, que não sabemos por onde começar. Como preencher as falhas de anos e anos de má educação? Algumas vezes parece tão desesperador que você quer desistir. Mas eu estava acordada às 2 da manhã outro dia, lendo os comentários que as pessoas estavam escrevendo nos posts sobre a diretora Lopez, e eu continuei rolando a tela, e rolando, e rolando, e isso me fez lembrar que eu sou importante aqui e que eu preciso continuar tentando”.
Até agora, mais de 10 anos de viagens à Harvard, e mais de 10 anos de programas de férias foram financiados pelas doações. Afora a ajuda financeira, o impacto causado pelo HONY deu mais motivação a alunos e professores para continuar em frente.
“Eu preciso admitir uma coisa para todos vocês. Antes de tudo isso, eu estava quase desistindo. Estava cansada. Eu queria escrever minha carta de demissão. Eu disse para minha mãe: ‘Mãe, eu não acho que consigo continuar fazendo isso. Porque eu não acho que meus estudiosos se importam, não acho que eles acreditam em si mesmos o suficiente para se importar. Eu temo que eles pensem que não são bons o suficiente’. E ela me disse para rezar por isso. Mas eu disse ‘Eu talvez esteja muito furiosa para rezar’. E então, algumas noites depois, eu estava com a minha filha em um show da Broadway, e estávamos esperando para o show começar, e comecei a receber várias mensagens de texto de professores e ex-alunos, e então vi o rosto de Vidal aparecer na minha tela. E meu primeiro pensamento foi que alguma coisa ruim tinha acontecido. Porque é o que normalmente acontece por aqui, quando a fotografia de alguém aparece de forma inesperada. E assim que entendi que Vidal tinha dito algo positivo sobre mim, o lanterninha veio e me pediu para desligar o telefone. No intervalo, minha filha disse: ‘Mãe, temos que descobrir o que está acontecendo’. Então fomos para o carro, e eu li o que Vidal disse, e comecei a ler os comentários. E lágrimas rolaram pelo meu rosto. Porque mesmo que eu sempre tenha dito a vocês que vocês são importantes, até aquele momento, eu não achei que vocês achavam que eu era importante”.
“Antes disso (do aparecimento no HONY), as pessoas viam as notícias na TV e nos jornais e pensavam que tudo que fazíamos era brigar e agir de forma descontrolada. Mas agora existem tantas pessoas que se importam com vocês, e que querem saber mais sobre vocês. As pessoas estão me mandando e-mails perguntando se podem conhece-los e se tornarem mentores de vocês. Não apenas pessoas de Brownsville, não apenas pessoas do Brooklyn, não apenas pessoas de Nova Iorque, mas pessoas do mundo todo. Então eu preciso que todos vocês se esforcem um pouquinho mais. Todas as vezes que vocês pensarem que não estão afim de fazer o dever de casa, eu preciso que vocês se lembrem que estão ajudando a construir a história de Brownsville”.
Na sua última postagem, Brandon explicou que o sucesso do financiamento coletivo foi tamanho, que eles criaram um terceiro propósito para as doações: a criação de um fundo para uma bolsa de estudos, que a cada ano será oferecida a um aluno diferente, escolhido por um conselho de educadores e administradores da Mott Hall Bridges Academy.
O nome dessa bolsa de estudos, como não poderia deixar de ser, será The Vidal Scholarship Fund. Todo o valor acima de 700 mil dólares será revertido para esse fundo, e o primeiro contemplado será o próprio Vidal.
Em menos de 15 dias, um impacto enorme em uma escola, na vida de dezenas de estudantes e professores, e mais de 2,59 bilhões de reais arrecadados.
Portanto, não venha me dizer que Brandon Stanton é apenas um fotógrafo, ou que o HONY é ~apenas~ uma página de fotografia do Facebook.
É muito mais do que isso. É uma mudança do mundo que começa pelo próprio quintal.
Post originalmente publicado no Brainstorm #9
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