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Insônia familiar fatal: a doença cerebral que não deixa você dormir


Algumas vezes, os piores pesadelos são aqueles que não temos. Várias condições, transtornos e doenças limitam o sono ou impedem que uma pessoa consiga dormir. Muitas delas são perigosas, mas nenhuma é tão assustadora ou rara quanto a insônia familiar fatal.

Doenças priônicas são uma categoria de doenças cerebrais raras e fatais que podem afetar tanto humanos quanto animais. A doença atinge o sistema nervoso e prejudica funções essenciais do cérebro, o que pode resultar em perda de memória, perda de quociente intelectual, mudanças de personalidade e comportamento, e insônia. Ela é causada por um gene PRNP alterado e mutante, herdado de um dos pais, que se manifesta em células de proteínas deformadas que podem aparecer no tecido cerebral.

Em seres humanos, cinco doenças priônicas são conhecidas: a doença de Creutzfeldt-Jakob, a Nova Variante da doença de Creutzfeldt-Jakob, a síndrome de Gerstmann-Sträussler-Scheinker, o kuru e a insônia familiar fatal. Em animais, são seis as doenças priônicas conhecidas, incluindo a encefalopatia espongiforme bovina, a famosa doença da vaca louca.

A primeira doença priônica foi identificada durante a década de 1730 (faz tempo), quando ovelhas e cabras na Grã-Bretanha começaram a sofrer com um problema misterioso que fazia com que elas se tornassem irritáveis, perdessem peso e se tornassem descoordenadas. A doença, que ficou conhecida como “Scrapie“, era capaz de matar rebanhos inteiros de uma vez. A scrapie só foi encontrada na Europa Ocidental nos duzentos primeiros anos de sua existência conhecida, mas, em meados do século 20, um fazendeiro de Michigan, nos EUA, importou uma ovelha da Inglaterra e seu rebanho inteiro acabou sendo morto pela doença. Hoje em dia, apenas Austrália e Nova Zelândia estão livres da doença, até onde sabemos.

Como outras doenças priônicas, a insônia familiar fatal (vamos chamar de IFF a partir de agora) é causada pela mudança ou mutação do gene PRNP, que permite que ela se aglutine na região do tálamo do cérebro, e destrua as células que estão lá. A região do tálamo controla os sentidos e capacidade motora, e também regula a consciência e os sonhos. O gene PRNP mutante “comendo” pedaços do cérebro, dando a ele um aparência de esponja. Isso pode levar à incapacidade de dormir (que se torna progressivamente pior com o tempo) e, se a pessoa conseguir dormir, ela tem sonhos vívidos. Ela foi observada em leituras de eletroencefalograma feitas enquanto a vítima acordada mostrada sinais associados ao sono REM. Em resumo, essas pessoas sofrem tanto para dormir que acabam entrando em um estado de sonho quanto estão acordadas.

Outros sintomas associados à IFF incluem dificuldades para desempenhar movimentos controlados ou coordenação, assim como mudanças de personalidade. Dependendo da gravidade dos sintomas, ela pode ser fatal em questão de meses ou persistir por alguns anos (piorando com o passar do tempo). O tempo de vida normal para alguém diagnosticado com a doença é de 12 a 18 meses — ela sempre causará a morte do paciente.

Estranhamente, os primeiros sinais e sintomas da IFF não se desenvolvem antes dos 40 ou 50 anos. Ninguém sabe exatamente por que o gene permanece inativo até lá, mas médicos teorizam que ele talvez seja estimulado ou ativado pela vulnerabilidade do cérebro na meia-idade.

Ninguém sabia na época, mas o primeiro caso registrado de IFF (mas provavelmente não o primeiro caso da doença) se deu com um médico veneziano em 1765. Originalmente acreditava-se que ele tinha morrido devido a um “defeito orgânico no coração”: ele sofria de “paralisia” e passava muitas noites sem dormir, sintomas que são consistentes com a IFF. Como documentado no livro A Família Que Não Pode Dormir, ele pode não ter sido o primeiro da sua família a morrer assim. O livro detalha 200 anos de história dessa família italiana e a sua batalha com essa doença genética rara.

Outros casos de IFF já foram registrados. Em 1991, um professor de música chamado Michael Corke, pouco depois do seu aniversário de 40 anos, começou a ter episódios de insônia. Conforme isso piorava e piorava, a saúde mental e física dele começou a deteriorar. Ele foi enviado para o hospital da Universidade de Chicago, nos EUA, e foi incorretamente diagnosticado com depressão severa. Os sintomas pioravam, já que ele não conseguia dormir. Por fim, os médicos o colocaram em coma induzido. No fim, Corke morreu seis meses após o início dos sintomas. Alguns anos depois, seu caso foi mostrado no documentário “O Homem Que Nunca Dormia”, da BBC. Não se sabe se outras pessoas da família de Corke sofrem com a mesma doença.

Outra doença interessante é de um homem do Vietnã chamado Thai Ngoc. Em 2004, ele alegava que não dormia havia 31 anos (desde 1973) após ter tido uma febre forte. Mesmo somando mais de 11.000 noites sem dormir, ele alegava que sofria de poucos efeitos mentais ou físicos. Alguns alegam que Ngoc é a prova de que a IFF nem sempre é fatal. Outros, especialmente médicos e especialistas, dizem que Ngoc está dormindo, só não sabe disso. De acordo com o Dr. Wadhwa, algumas pessoas que sofrem de insônia não conseguem perceber a diferença entre dormir e estar acordado e tiram vários pequenos cochilos ao longo do dia.

Bônus:

  • De acordo com diversas fontes de notícias dos anos 1930 que chegaram ao rapaz, incluindo a edição de 16 de janeiro de 1930 do Chronicle, um soldado húngaro chamado Paul Kern foi baleado na cabeça durante a Primeira Guerra Mundial e perdeu parte do lóbulo frontal. Após acordar no hospital Lemberg, ele (supostamente) não voltou a dormir, e morreu em 1955. Kern retornou à Hungria como um herói de guerra e muitos cientistas, incluindo o professor especialista em doenças mentais de nervosas da Universidade Eötvös Loránd, Ersnt Frey, estudaram Kern. No entanto, ninguém conseguiu determinar por que ele não conseguia dormir, nem como seu cérebro e corpo continuavam funcionando de maneira mais ou menos normal, mesmo sem que ele atingisse o estado que conhecemos como sono. Dito isso, assim como no caso de Thai Ngoc, é possível que o cérebro dele mudasse para um estado de sono durante os períodos de descanso recomendados pelos médicos, mas ele continuava responsivo e consciente durante esses períodos.
  • Muitas pessoas têm medo de dormir, mas ninguém parece ter medo de dormir em uma cama. No entanto, nos Estados Unidos, cair da cama é a causa de 450 mortes, 400.000 entradas no hospital e 1,8 milhões de visitas à sala de emergência anualmente.

Matt Blitz escreve no popular site de fatos interessantes TodayIFoundOut.com. Inscreva-se no mailing do Today I Found Out’s “Daily Knowledge” clicando aqui or curta eles no Facebook aqui. Este post foi reproduzido com permissão do TodayIFoundOut.com. Imagem de capa Lindsey Turner sob licença Creative Commons.

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