Os recentes casos de espionagem de brasileiros pela NSA são graves e inadmissíveis, não podemos aceitar este tipo de invasão de privacidade. Mas a resposta do Gov. Dilma não vai resolver o problema, vamos continuar expostos à espionagem e será ainda mais difícil criar empresas inovadoras no Brasil.
A presidente Dilma Rousseff está apoiando uma nova legislação que buscará forçar Google, Facebook e outras empresas de Internet a armazenarem dados coletados localmente dentro do Brasil. (fonte: Reuters)
A Internet na visão do Gov. Dilma
O Governo Dilma quer obrigar empresas de internet a ter dados em solo nacional, com isso as companhias se submeteriam à leis do Brasil e não entregariam informações de brasileiros para a NSA ou outros órgãos de espionagem. Acontece que as empresas já estão sujeitas às leis brasileiras e, além disso, obrigar essas companhias a manter dados no Brasil não nos protege de espionagem e só piora a situação do nosso mercado de tecnologia. Explico.
O Governo Dilma acha que a Internet é igual a contêiner em porto: se o contêiner estiver aqui, não estará nos EUA. Eles não sabem que informação digital é infinitamente duplicável? Suponhamos que a rede social mantenha os dados aqui, obedecendo a lei brasileira, a cada milissegundo a empresa ainda poderá fazer backup nos EUA (para processar e armazenar, por exemplo). A NSA poderá pegar os dados nos servidores dos EUA do mesmo jeito!
É impraticável o governo brasileiro impedir as empresas digitais de fazer backup fora do Brasil, não é assim que a internet funciona, todos os dados precisam estar acessíveis de qualquer lugar da Terra ou até fora do planeta.
Obrigar empresas de tecnologia a manter dados no Brasil só encareceria a operação de negócios online em nosso país e dificultaria inovação e empreendedorismo. Ao serem obrigados a manter dados no Brasil, os gigantes como Google e Facebook pagariam a conta, eles faturam bilhões de reais por ano com publicidade e podem acomodar este novo custo em suas planilhas financeiras. Já as startups, empresas pequenas e médias, seriam profundamente impactadas pela obrigação de contratar servidores no Brasil. Em uma estimativa que fiz para a infraestrutura de servidores usada pela boo-box, gastaríamos 6 vezes mais contratando os servidores no Brasil em comparação com os serviços hoje contratados nos EUA.
Sem condições de arcar com os custos exorbitantes dos data centers nacionais, os empreendedores brasileiros certamente criariam maneiras alternativas de fazer negócios online, como os argentinos fizeram ao fundar suas empresas em Miami em vez de fazê-lo no seu próprio país. Um bom exemplo é o Decolar.com, empresa criada em Miami por argentinos, para atender ao mercado do país dos empreendedores, mas gerando emprego e pagando impostos nos EUA, adicionando aproximadamente US$1 bilhão ao PIB americano (e não ao da Argentina). Obama agradece.
Ao contrário do que alguns podem pensar, a obrigação de usar servidores no Brasil não iria baratear os serviços, os fatores que encarecem o setor no Brasil vão muito além da simples lei da oferta e da procura.
Um relatório de 2012 da empresa imobiliária Cushman & Wakefield e da consultoria em engenharia hurleypalmerflatt elencou os 30 países em termos de riscos para operações de data centers. O Brasil ficou em último lugar devido, principalmente, aos altos custos de eletricidade, baixos níveis educacionais e um ambiente ruim para os negócios. (fonte: Reuters)
As empresas de internet com operação no Brasil já obedecem as leis brasileiras, constantemente Google e Facebook liberam montanhas de dados de seus usuários a pedido da justiça brasileira (com mandado etc), veja por exemplo “Google Brasil terá de fornecer e-mails trocados entre pessoas investigadas em inquérito” e “Corte Especial determina que Google entregue dados de e-mail armazenados nos EUA“.
Internet não é terra de ninguém, as leis brasileiras existentes já funcionam para casos online e são usadas todos os dias, com colaboração (voluntária ou imposta) das empresas que operam no país.
Detectamos esses absurdos com leis voltadas para a internet, indústria que conhecemos. Extrapolando, os mesmos erros devem acontecer nos setores de energia, infraestrutura, saúde, educação etc, né?
Foto: Cargo Container Ship, Shutterstock.