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“Para Sempre Alice”: O mal de Alzheimer em um drama essencialmente familiar


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⚠ AVISO: Contém spoilers

Sob uma ótica óbvia e imediatista, “Para Sempre Alice” se apresenta como um simples retrato de uma vítima do Mal de Alzheimer. Um olhar mais cuidadoso, porém, ajuda a consolidar o filme como um competente drama familiar, capaz de oferecer perspectivas variadas e precisas sobre o efeito da doença no convívio da personagem do título com seu núcleo mais próximo. O roteiro de Richard Glatzer e Wash Westmoreland (também diretores), escrito a partir do romance de Lisa Genova, traz a protagonista (Julianne Moore, premiada com o Oscar pelo papel) como uma renomada professora de linguística de Columbia que, de início e por uma triste ironia, passa a esquecer palavras – para depois ver o restante de sua memória se perder.

Há duas esferas mais evidentes sobre as quais os desdobramentos desta condição de saúde ocorrem: a pessoal e a profissional. A primeira, que parece ser central aqui, é acompanhada desde a preocupação da própria Alice com os primeiros esquecimentos, em um exercício narrativo extremamente interessante que mergulha na percepção angustiada da protagonista sobre os sintomas.

Vale notar como a câmera se movimenta de maneira acelerada em momentos nos quais ocorre perda de noção espacial e de localização, como no incidente da busca por um banheiro dentro de casa. À medida que os problemas são divididos para além da esfera íntima e particular, porém, a trama se volta para as reações de seu marido, John (Alec Baldwin), e de seus três filhos, Anna (Kate Bosworth), Tom (Hunter Parrish) e Lydia (Kristen Stewart).

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ulianne Moore com os diretores Richard Glatzer e Wash Westmoreland

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Por mais que o trio sofra de um certo grau de apatia e falta de identidade, sobretudo no caso do rapaz e exceção feita à filha mais jovem, ele sintetiza posições divergentes com relação à condição da mãe, o que ganha reflexos na forma com que cada um deles é encarado em termos do tom assumido e até mesmo da faixa sonora que os acompanha.

Durante uma palestra, por exemplo, a câmera se fixa em Anna durante o discurso de Alice por um momento que se prolonga alguns segundos a mais do que quando os outros presentes são enquadrados. Além de um sinal de sua maior importância, trata-se também de parte da construção desse drama familiar tão caro ao filme, uma vez que a personagem fala em passado e futuro diante da gravidez que trará seu primeiro casal de netos – um fator que ainda ganha em relevância a partir daí.

O aspecto privado se torna relevante também quando se percebe que a ação se concentra dentro da casa dos Howland, o que torna um pouco mais sutil o contraste entre a normalidade habitual e a excepcionalidade da situação. Nas sequências em que o foco sai dali, essa linha se torna frágil e se desfaz de maneira mais fácil. É o que acontece nas voltas pela praia, nas idas ao consultório médico, nas derradeiras tentativas em sala de aula, na visita à casa de repouso, nas sempre reveladoras conversas por Skype e na sintomática corrida no entorno da universidade, logo no início da projeção.

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A abordagem de “Para Sempre Alice” não é clínica, mas essencialmente sentimental

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O desenvolvimento familiar da narrativa surge, inclusive, no que tange ao enfoque profissional da questão. Seu momento-chave é imediatamente relacionado à casa: quando a dificuldade de Alice para continuar dando aulas é abordada, um colega de trabalho questiona sobre John e, em seguida, sobre problemas particulares, antes que ela conte a ele sobre a doença. Assim, mesmo que jamais se desvencilhe por completo da família e de consequências pessoais, a carreira da protagonista tem como função oferecer uma nova camada para que a questão seja discutida, da deterioração mais rápida das funções cognitivas ao desafio da adaptação a uma realidade em que o intelecto não mais desempenha o papel principal.

É nesse sentido que “Para Sempre Alice” se propõe a trabalhar a ressignificação de imagens e significados realizada por sua protagonista. A abordagem não é clínica, mas essencialmente sentimental, e se ancora tanto em fotos das crianças espalhadas pela casa quanto no recurso a cenas que simulam algo entre sonhos e rastros de imagens. Seguindo esta linha, o desfecho é uma espécie de momento de comunhão entre futuro, presente e passado, talvez ali reunidos na eternidade, que parte da declamação de parte da peça “Angels in America”, de Tony Kushner, por Lydia (em uma bela performance de Stewart) em direção ao vestígio de memória mais importante – e fundamentalmente familiar – da personagem principal.

deff b feedPost originalmente publicado no Brainstorm #9
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