Disneyland inaugura nova versão de Star Tours, 24 anos depois da abertura original, e comprova a força de uma marca inabalável por mais de três décadas de existência, globalização e que sempre encontra modos de revitalizar seu público.
Ser nerd tarja preta tem suas vantagens. Você comete insanidades [pelo menos para pessoas normais] sem pensar duas vezes, não se arrepende e, quando pode, faz tudo de novo, afinal, com paixões não se brinca e “Guerra nas Estrelas” é a minha maior tara cultural.
Só o fato de usar o nome em português entrega a idade e o nível de devoção, afinal, desde o final de década de 90 a marca passou por um alinhamento mundial e as traduções caíram para o guarda-chuva “Star Wars” ser adotado em tudo quanto é canto. Logo, só para deixar claro, “Guerra nas Estrelas: Uma Nova Esperança”, virou “Star Wars: Uma Nova Esperança”, e assim por diante.
A história dessa marca, cujo logotipo nunca mudou em essência e só sofreu leves atualizações – como ganhar volume 3D e adotar a cor dourada como padrão -, é repleta de contra-indicações estratégicas e muita sorte, além de total dependencia de um mercado criado quase sem querer, para resistir ao tempo. Fato é, no último dia 3 de junho, quando a Disneylândia reabriu a atração Star Tours, originalmente inaugurada em 1987, uma movimentação humana gigantesca coroou a natureza eterna e “força” constante de “Star Wars”.
As filas que começaram a se formar desde 5 da manhã
Ah, Barreto! Tá sendo fanboy! Inicialmente, sim, mas vamos entender as razões de tudo isso, num breve resumo:
Depois que os filmes clássicos saíram do cinema, os fãs do então “Guerra nas Estrelas” amargaram uns bons 20 anos sem nada realmente novo e relevante. Foram tempos sombrios, tempos de dependência dos quadrinhos [“Império do Mal” é o melhor exemplo] e de alguns livros realmente marcantes como “Sombras do Império” ou “The Han Solo Adventures”, além, claro, das trocentas reedições dos filmes em VHS (tenho todas elas, aliás, 8 para ser mais exato).
O grande segredo, porém, foi licenciamento. Com um trabalho agressivo e constante no mundo todo, a marca se perpetuou apostando em sua força cultural e, especialmente nos Estados Unidos, num culto alimentado por pais e filhos. Diferente de “Jornada nas Estrelas”, por exemplo, que sempre teve mais apelo adulto, “Guerra nas Estrelas” agradava todo mundo e isso alavancou vendas de itens que variavam entre kits de roupa de cama baratinhos até colecionáveis milionários. E um dos elementos fundamentais dessa manutenção foi o Star Tours, atração presente nos resorts da Disney.
Com custo inicial de US$ 33 milhões, a atração foi aberta no início de 1987 e catapultou vendas de camisetas e brinquedos desde então. Para quem nunca foi, basicamente, o Star Tours jogava o visitante numa espaçonave de turismo envolvida na luta entre Aliança Rebelde e Império Galáctico. O filme era fixo, logo, cada visita gerava a mesma experiência, que poderia ser piorada por um forte cheiro de CO2 gerado pelos amortecedores da “nave”.
Era um reflexo direto do efeito e da popularidade da Trilogia Clássica logo após a passagem dos filmes pelo cinema. Muito tempo passou, a marca se manteve forte e voltou a crescer na última década quando a Nova Trilogia estreou com muita tecnologia. Levando tudo isso em conta, o Star Tours passou a ser o patinho feio do universo Star Wars sendo totalmente ultrapassado. Desde o ano passado, a Walt Disney Resorts (com a tutela da Disney Imagineering) resolveu revitalizar a atração.
Misturando o carinho dos fãs com o brinquedo, a visita de George Lucas à reinauguração, na Flórida, uma semana antes, a realização do “Star Wars in Concert” (evento de música clássica com a trilha sonora da Saga) e o conveniente anúncio da nova Star Wars Celebration para 2012, o resultado foi fantástico. Os primeiros fãs chegaram às 5 da manhã para garantir um bom lugar, a Disney montou uma operação de guerra no estacionamento – “estamos esperando um público gigantesco hoje por causa da inauguração”, disse uma funcionária – e a fila de mais de três horas foi encarada sem reclamação, com fantasias, colecionáveis, camisetas e muitos sorrisos.
O mais interessante foi comprovar a força, e abrangência, da marca nos Estados Unidos. A maioria do público era, claramente, de jovens entre 22 e 30 anos, mas a grande quantidade de crianças e veteranos do fandom transformou a fila em si num evento, afinal, todos estavam participando do Dia de Inauguração e escrevendo mais um capítulo de sua história pessoal com a Saga.
Camisetas e colecionáveis esgotaram-se nas primeiras horas e as pessoas não paravam de chegar. Assim que saim da atração, voltavam para a fila não pela simples devoção, mas pela nova natureza da brincadeira: cada rodada mostra um filme diferente, ou seja, uma visita a uma série diferente de planetas do universo Star Wars (Hoth, Tatooine, Coruscant, Naboo, Kashyyyk, Geonosis e tantos outros). A atração é 3D, com óculos Dolby, e tem uma pequena porção interativa na qual um dos fãs é identificado como “espião rebelde” e sua foto é exibida na tela enquanto os pilotos, agora R2-D2 e C-3PO, tentam fugir de Darth Vader.
Seguindo seu histórico de mudanças leves, o Star Tours passou apenas por uma atualização em seu logotipo, agora apresentado com luzes no pano de fundo simulando um salto no hiperespaço e a tag line: The Adventures Continues (As Aventuras Continuam). O piloto inexperiente Rex, que não aprendeu nada em 24 anos, foi aposentado e pode ser visto na fila interna, dentro de uma caixa de peças sobressalentes. Tudo está mais moderno, incluindo uma câmera filmando os visitantes e mostrando uma imagem num grande monitor pouco antes do embarque.
Com tanta força de público – que pagou uma grana considerável para visitar a Disneyland só para prestigiar uma atração – e seus resultados sólidos, Star Tours deixa o triste lugar de brinqueido com pouca fila e apenas atraente para crianças para ser a principal atração dos parques, afinal, cada visita vai gerar uma viagem diferente. Uma jogada de mestre, sem arriscar muito, e entregando exatamente o que seus clientes esperam.
Post originalmente publicado no Brainstorm #9
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