Quando eu dei motivos para você se importar com o Super Bowl, isso sem considerar qualquer predileção esportiva, é claro, deixei propositalmente um aspecto fundamental de fora.
Os shows do intervalo – e que não incluem tira-teimas, nem comentaristas falando diante de um campo virtual – merecem um capítulo a parte. Aqui os números também são hiperbólicos, mas a característica do produto é especial, trazendo mais uma indústria poderosa para a panela bilionária de mídia.
Além da torcida no University of Phoenix Stadium, Katy Perry deve se apresentar este ano para mais de 110 milhões de espectadores que estarão sintonizados na TV. Some nessa conta aqueles que assistirão via stream pela internet, totalizando 230 países atingidos. Serão pouco menos de 15 minutos, mas capazes de entregar a música da cantora para uma abrangência demográfica que ela jamais atingiria sozinha. Ah, já ia me esquecendo, alguém também convidou o Lenny Kravitz.
O Halftime Show se tornou um espaço cobiçado: a audiência aumenta, as vendas de álbuns também
No ano passado, após apresentação no intervalo do Super Bowl, Bruno Mars viu as vendas de seus álbuns dispararem, um crescimento de 180%, segundo a Billboard. A audiência no momento atingiu 115.3 milhões de espectadores, superando o próprio jogo em si. Algo que certamente o ajudou a colocar na lista da Forbes dos músicos mais poderosos do mundo.
Ao longos dos anos, tamanho alcance acabou transformando os 15 minutos de Halftime Show em um espaço cobiçado. Gravadoras disputam a tapa qual de seus artistas deve se apresentar. Tudo de graça, sem cachê, com a NFL bancando apenas os custos de passagem, hospedagem e produção do show.
O rumor recente, negado pelas partes, é de que Katy Perry teria sido “convidada” a doar alguma contribuição financeira para a NFL. E nem precisava ser à vista. Uma parcela dos lucros da cantora com as turnês pós-Super Bowl estava valendo. Ainda que não desta vez, o pay-per-play é um cenário bem provável para os próximos anos.
Com o patrocínio do intervalo, a Pepsi quer ser a marca mais comentada do Super Bowl
A outra torneira de entrada de dinheiro que a NFL explora bem é o patrocínio do show do intervalo, que se tornou um grande negócio principalmente com a Pepsi e Bridgestone nos anos 2000. Outras empresas já tinham patrocinado bem antes disso, mas nunca com consistência e contexto.
É o momento em que as marcas podem se aproveitar da poderosa união esportes e música, desempenhando um importante papel diante dos milhões de jovens ligados no jogo. É na hora do show, aliás, que a audiência feminina aumenta. O valor do intervalo não é calculado apenas com base no número bruto, mas principalmente por falar com um público específico, talvez não tão aficcionados pelo esporte em si, mas vitais para o futuro da liga.
O objetivo da Pepsi, aliás, é ser a marca mais comentada durante e depois do jogo, aproveitando o alto índice de jovens na segunda tela (ou seria a primeira?). Dessa forma, a estratégia não é apenas colocar a Katy Perry para cantar, mas também gerar uma série de ativações pré-Super Bowl. Algo natural para o DNA da empresa, que já é intimamente ligada ao mercado musical, e tem promovido o show desde agosto do ano passado.
Para a NFL, porém, nem sempre foi essa festa.
O efeito Michael Jackson
A possibilidade de tocar “Heal The World” para 90 milhões de pessoas convenceu o astro
O show do intervalo do Super Bowl levou muito tempo para ganhar a dimensão que tem hoje, antes dominado por artistas locais e bandas marciais universitárias. A NFL precisou ser desafiada para entender que a pausa do jogo deveria ser uma extensão do espetáculo, tornando-se um grande evento midiático, sem essa de parar por 15 minutos.
Em 1992, a Fox – que ainda não fazia parte das emissoras parceiras – criou a primeira tentativa de contra-programação do Super Bowl. Durante a apresentação de Gloria Estefan, do jogo que era transmitido pela CBS naquele ano, levaram ao ar um episódio especial ao vivo da série de comédia “In Living Color”.
O resultado foi imediato. A Fox “roubou” mais de 22 milhões de espectadores do Super Bowl durante o intervalo. Obviamente, grande parte retornou para ver o final do jogo, mas ainda assim foi um impacto que transformaria a história do evento. Some a isso uma sequência de anos com audiência abaixo da casa de 79 milhões de espectadores.
Logo em 1993, a NFL estava disposta a combater qualquer tentativa de programação concorrente, e para tanto apostaram alto. Convocaram Michael Jackson.
Era notório que o astro pouco entendia ou se importava com futebol americano, mas seus agentes o tentaram convencer dizendo que a audiência era grande, atingindo muitos países pelos quais ele nunca tinha feito turnê e bases militares. Seu disco mais recente à época, “Dangerous”, já estava há 2 anos no mercado. O cachê, para os padrões do artista, era irrisório: 1 milhão de dólares.
Mas o que convenceu Michael Jackson foi a ideia de terminar o show com a música “Heal The World”. Segundo ele, era uma canção com significado, diferente dos seus hits do passado. Aliado a isso, a NFL se comprometeu a doar 100 mil dólares para a Heal the World Foundation.
A apresentação foi um estrondo. Um dos eventos musicai de maior audiência em todo o mundo. “Jam”, “Billie Jean”, “Black or White”, um trecho de “We Are The World” – com direito a mosaico formado pelo público presente – e, claro, “Heal the World”.
Paul McCartney, U2, Rolling Stones, Aerosmith, U2, Prince, Bruce Springsteen e Madonna são alguns dos nomes que já tocaram no Super Bowl
Depois de muito tempo, os espectadores do Super Bowl superaram a marca dos 90 milhões de espectadores, um crescimento de 10% em relação a edição anterior, e, principalmente, a NBC evitou que as pessoas tocassem no controle remoto entre um tempo e outro da partida, disputada na época por Dallas Cowboys e Buffalo Bills.
Michael Jackson abriu caminho para que outros artistas de renome se interessassem em se apresentar de graça no intervalo do Super Bowl. Diana Ross, Stevie Wonder, Aerosmith, U2, Paul McCartney, Rolling Stones, Prince, Bruce Springsteen, Madonna e Beyoncé estão entre os nomes que já tocaram nesses 15 preciosos minutos.
A sede de dinheiro da NFL, que está a ponto de declarar que acha justo que os artistas paguem para tocar, é vista como um ato mercenário. Porém, ninguém pode negar que a vitrine do Super Bowl não tem paralelo. Quando a questão é atingir tantos olhos grudados na televisão, vale tudo. Lembre-se: as marcas estão pagando 4.5 milhões por apenas 30 segundos, quanto vale 15 minutos? O engraçadinho que responder 135 milhões leva um pescotapa.
Post originalmente publicado no Brainstorm #9
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