Ao ser entrevistado por uma jornalista sobre o tema mudança de porte empresarial, entre micro e pequenas empresas e empreendedores individuais, surpreendi-me com a pergunta induzida, de que se não seria por falta de planejamento formal o baixo índice de mudança de porte empresarial entre estes segmentos.
A jornalista tinha em mente, como tem boa parte dos adeptos do velho empreendedorismo, que a solução às questões empreendedoras está na ferramenta, no caso, o Planejamento Estratégico.
Entretanto, ao respirarmos devagar, temos a oportunidade de ver a questão referida sobre um novo olhar, o olhar de um Novo Empreendedorismo.
Vamos comparar, sem emoções, admiração ou raiva, os Estados Unidos da América e o Brasil. Por que eles conseguiram progresso, êxito científico, tecnológico e, sobretudo, econômico e nós continuamos, há décadas, sendo a eterna promessa de país do futuro, mesmo tendo a ilusão de que este momento já chegou? Muitas explicações cabem nesta complexa questão: a diferença de cultura, de raças, de topografia, de geografia, de tecnologia, de apoio dos países de origem, e muitos outros fenômenos poderiam contribuir para entendermos os distintos resultados entre os dois países.
De todas as semelhanças e\ou diferenças possíveis entre a formação e o desenvolvimento das duas nações, chama a atenção uma, que aos meus olhos parece fundamental: a visão de mundo entre os dois povos. Os americanos fundamentados na ética protestante, de acordo com Max Weber em seus estudos realizados em países como a Inglaterra, Suíça, Alemanha e Holanda, e expostos em sua obra “Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”, valorizam extraordinariamente o trabalho.
A palavra “vocação” surgiu pela primeira vez numa tradução da bíblia por Lutero, que deu ao termo o significado de trabalhar para a satisfação da vontade de Deus. A ociosidade, portanto, é pecado grave. Deus aprecia quem trabalha intensamente na sua vocação, ganha dinheiro e não gasta com supérfluo. E mais: se, por ventura, defronta-se com duas oportunidades de ganho, o fiel deve seguir aquela que lhe traga mais lucro. Caso contrário, estará desrespeitando a vontade do Senhor.
A palavra “lucro”, que em inglês é profit, tem sua origem no termo proficient, que significa proficiência, competência. Mesmo sem nos aprofundarmos, já podemos perceber que este conjunto de crenças levou o povo americano a trabalhar muito, perseguir o lucro, não gastar e acumular fortunas.
Tudo legitimado por Deus. Fez, como consequência de sua visão de mundo, uma clara opção pela riqueza.
De nosso lado, a palavra “lucrar”, de acordo com o Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, significa:
1 – Tirar vantagem de, aproveitar;
2 – Gozar, desfrutar;
3 – Conseguir, lograr.
Ou seja, está embutida na palavra “lucro” o sentimento de roubo. É comum termos a percepção de que alguém que está ganhando muito deve estar “passando a mão”. Se nós próprios estamos numa boa situação financeira,
não é incomum termos um desconfortável sentimento de consciência pesada.
Além disso, quando temos dinheiro sobrando, vamos logo às compras. Se não temos, vamos também. Não temos a cultura da poupança. Nem no campo individual, nem das instituições. Logo, a existência de nossas imensas dívidas jamais deveria ser surpresa ou incompreendida por nós. Só refletem nossa visão de mundo.
Para coroar, temos como pano de fundo de nossas ações a ética católica, que diz que “é mais fácil um camelo passar pelo buraco da agulha do que um rico entrar no reino dos céus”. Fizemos, como consequência de nossa visão de mundo, uma clara opção pela pobreza. E o interessante é que Deus é o mesmo, tanto para nós, quanto para eles.
E não podemos desconfiar, por um momento que seja, que Deus é brasileiro. Vejamos as pujanças do Brasil: temos vinte por cento de todas as espécies de animais do planeta. De cada cinco espécies de vegetais do mundo, uma está no Brasil. Temos autossuficiência em petróleo. Temos a maior disponibilidade hídrica da terra. Somos o maior celeiro de grãos do mundo. Temos uma área de floresta com cerca de 6,8 milhões de km2 em um território de 8,6 milhões de km2.
O que estas informações dizem para nós? Dizem, com letras garrafais, que o Brasil é um país rico. Aliás, muito rico! A indignação fica por conta de vivermos num país com tanta pujança e ao mesmo tempo sermos o retrato da pobreza. Somos o sexto país mais rico do mundo com base no PIB e, no entanto, somos o centésimo primeiro em termos de distribuição de renda. Um indicador claro que o velho empreendedorismo voltado para ferramentas de gestão não funciona.
O Novo Empreendedorismo privilegia antes de tudo, uma visão de mundo próspera, cujo empreendedor se encante com a possibilidade de crescimento contínuo até a mudança de porte empresarial e tenha como visão de futuro tornar-se um empresário rico e feliz.
Neste caso, e somente nestes casos, é que as ferramentas de gestão passam a ter sentido e tornam-se úteis.