Ian Bogost é crítico, filósofo e designer de games. Co-fundador da Persuasive Games, professor no The Georgia Institute of Technology, e autor dos livros “Unit Operations: An Approach to Videogame Criticism” (2006), “Persuasive Games: The Expressive Power of Videogames” (2007), “Racing the Beam: The Atari Video Computer System” (2009), “Newsgames: Journalism at Play” e “How To Do Things with Videogames”(2011).
Texto originalmente publicado em seu blog: bogost.com/blog. No Twitter: @ibogost
Em seu breve tratado “On Bullshit”, o filósofo Harry Frankfurt nos oferece uma útil teoria sobre a bobagem, a besteira, ou no bom inglês: “bullshit”. Nós normalmente pensamos no bullshit como um sinônimo – embora um pouco vulgar – para mentira ou engano. Mas Frankfurt argumenta que bullshit nada tem a ver com a verdade.
Ao invés disso, bullshit é usado para esconder, para impressionar ou para coagir. Ao contrário dos mentirosos, bullshitters não tem utilidade alguma para a verdade. Tudo o que importa para eles é esconder sua ignorância ou usar em benefício próprio.
Gamification é bullshit.
Não estou sendo arrogante ou provocativo. Estou falando filosoficamente.
Mais especificamente, gamification é bullshit de marketing, inventado por consultores como um meio para capturar os animais selvagens e cobiçados que são os videogames, e domesticá-los para uso no deserto acizentado e sem esperança do mercado corporativo, onde o bullshit já reina de qualquer maneira.
Bullshitters são muitas coisas, mas eles não são estúpidos. O poder retórico da palavra “gamification” é enorme, e ela faz exatamente o que o bullshitteiro quer: Pega os games – uma misteriosa, mágica e poderosa mídia que captura a atenção de milhões de pessoas – e os torna acessíveis no contexto contemporâneo de negócios.
Gamification é reconfortante. Dá aos Vice-Presidentes e Gerentes de Marca o conforto: eles estão fazendo tudo certo, e eles podem fazer ainda melhor acrescentando “uma estratégia de jogos” aos seus produtos existentes, espalhando “gaminess” como o alho-e-óleo na ciabatta do almoço dos indulgentes consultores de venda.
Gamification é fácil. Oferece abordagens simples e repetitivas, na qual benefício, honra e estética são menos importantes do que a facilidade. Para consultores e startups, isso signfica vender a mesma bobagem em livros, workshops, plataformas ou APIs uma vez atrás da outra, a um custo incremental ilimitado. Isso marca caixinhas. Estratégia de mídias sociais? Check. Estratégia de games? Check.
O título do evento na imagem acima prova pontos importantes para mim: o slogan “For The Win”, acompanhado por uma pomposa seta orçamental e um foguete tumescente, sugerindo o inevitável priapismo que essa poderosa pílula vai lhe trazer – um Viagra para disfunção de engajamento, com ingurgitamento garantido para o próximo trimestre fiscal.
Este poder retórico deriva do sulfixo “-ification” e não da palavra “game”. -Ificação envolve técnicas e dispositivos simples, repetitivos e provados: Você pode purificar, embelezar, falsificar, aterrorizar, e assim por diante. -Ificação é sempre fácil e repetitivo, e normalmente é bullshit. Basta adicionar pontos.
Desenvolvedores de jogos e jogadores tem criticado o conceito de gamification, alegando que isso interpreta os games erroneamente, confundindo propriedades incidentais como pontos e níveis com funções primárias de interação e complexidade comportamental. Isso pode ser verdade, mas a verdade não importa para bullshitters. De fato, o próprio sentido de gamification é tornar a venda o mais fácil possível.
Eu sugeri o termo “exploitationware” como um nome mais preciso para o verdadeiro propósito de gamification, para aqueles de nós que ainda estão interessados na verdade.
Exploitationware captura as reais intenções de uma estratégia de gamification: um jogo de fazer dinheiro, escolhido para capitalizar um momento cultural, através de serviços sobre os quais eles tem experiência questionável e para trazer resultados que durem apenas o tempo suficiente para preencher suas contas bançarias antes que a próxima tendência bullshit apareça.
Eu não sou ingênuo e eu não sou um tolo. Eu percebo que gamification é a resposta fácil para implantar uma perversão dos jogos como um milagre de marketing. Eu percebo que o uso honesto dos jogos significaria alterar o modus operandi da maioria das empresas.
Para aqueles cujo objetivo é sair às 5 da tarde tendo superado a estratégia e o desempenho de seus concorrentes, eu entendo que os lábios da mediocridade são sedutores, já que eles estão sempre dispostos.
Quanto ao resto, aqueles que considerariam que os jogos podem oferecer algo diferente e maior do que uma afirmação de práticas corporativas já existentes, o mundo dos negócios tem outro nome para você: eles te chamam de “líderes”.
Post originalmente publicado no Brainstorm #9
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