Recife – Fixando o olhar para além dos problemas comuns enfrentados por qualquer comunidade carente do Grande Recife, é possível divisar a cena cultural efervescente da Bomba do Hemetério, bairro da zona norte da cidade. Lá estão a troça Abanadores do Arruda, a agremiação carnavalesca Gigantes do Samba, o Caboclinho 7 Flexas e o Maracatu Nação Estrela Brilhante. Eles são alguns dos exemplos dos mais de 60 grupos culturais da localidade, alguns com mais de 400 participantes. “Trabalhamos para que essas atividades da natureza humana se transformem em algo tangível”, afirma o superintendente do Sebrae no estado, Roberto Castelo Branco.
“A beleza da Bomba está no amor à cultura e à riqueza imaterial”, afirma Karina Zapata, assessora técnica do Instituto de Assessoria para o Desenvolvimento Humano (IADH), uma das entidades envolvidas no trabalho de desenvolvimento do bairro com foco na economia criativa. “O Sebrae atua na busca de uma estrutura de negócio, pois esses elementos estão presentes de uma forma intuitiva e voluntária. Também promovemos o trabalho da comunidade para que os elementos da economia criativa sejam conhecidos em outros estados e atraiam”, completa Castelo Branco.
Foi esse caldeirão cultural que chamou a atenção da inglesa Jude Kelly, um dos nomes mais influentes no Reino Unido no campo da economia criativa. Presidente do Comitê para as Artes, Educação e Cultura das Olimpíadas de Londres, Kelly esteve no Recife para identificar oportunidades para o Transform, que será lançado em 2012 e levado a diversas cidades brasileiras durante seis meses. O programa promove iniciativas que formem vínculos de longo prazo entre indivíduos, instituições e governos dos dois países. Jude Kelly também passou por Salvador e Manaus.
“Esses projetos da Bomba do Hemetério são extremamente criativos. Dos melhores que eu já vi. E olhe que eu já estive em muitos lugares”, afirma Jude Kelly após ter sido apresentada às ações desenvolvidas na comunidade. “São coisas sobre as quais temos enorme interesse no Reino Unido. É uma iniciativa maravilhosa. Temos muito a aprender com o que está sendo feito aqui”, completa a inglesa. Ela conheceu manifestações culturais como a agremiação carnavalesca Gigantes do Samba. No galpão da escola, ela teve contato com o trabalho desenvolvido pelas aderecistas, em pleno processo de confecção das peças que serão exibidas no Carnaval. “Tem gente aqui na comunidade que tem um valor que nem eles mesmos sabem. Isso aqui é uma terapia para as pessoas”, diz a costureira Marinalda Nogueira diante do olhar curioso de Kelly.
Outra manifestação artística apresentada a Jude Kelly foi o Balé de Cultura Negra do Recife, o Bacnaré, conhecido por espetáculos de danças senegalesas, sul-africanas e angolanas, entre outras. O grupo tem 45 integrantes, com idades dos sete aos 47 anos. Muito deles são jovens carentes da própria comunidade. “Mesmo sendo de baixa renda, eles se esforçam para ser alguém. Muito do que eles aprendem aqui já estão repassando em escolas como arte-educadores”, revela Antônia Batista, coreógrafa e figurinista do Bacnaré. Além de conhecimento, os jovens também são remunerados pelo trabalho no grupo.
“Meu trabalho é social, o que é a base de tudo. Nosso objetivo é que esses jovens se tornem arte-educadores. Ao invés de ficarem perambulando pela rua, sem ter o que fazer, eles podem aprender uma arte”, afirma Antônia. Fundado há mais de duas décadas, o Bacnaré já levou sua arte a Europa, Ásia e América Latina. É um dos grupos brasileiros com mais prêmios internacionais. Além da dança, o grupo tem como fonte de renda a produção e venda de peças como pulseiras, camisas e bonecos de figuras do caboclinho, do frevo e do maracatu, entre outras. “A gente dá essa oportunidade a esses jovens. Formamos cidadãos”, diz a coreógrafa.
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