De acordo com o The Washington Post, que publicou uma grande reportagem investigativa sobre a NSA, a agência norte-americana intercepta dados sem se preocupar com a origem deles: nove entre dez mensagens interceptadas pela NSA são de pessoas comuns, e não alvos de investigações, e as conversas privadas e fotos estão facilmente acessíveis nos bancos de dados da agência.
Quão ampla é a rede da NSA? A reportagem indica que a agência desafia os limites da razão e lógica ao determinar o que ela considera um “alvo estrangeiro”. Cidadãos dos EUA que escrevem emails em idiomas diferentes do inglês, ou que conversam com pessoas de outros países, ou que usam proxy para ver algo não disponível por lá são considerados alvos, e eles então passam a bisbilhotar as conversas. O Post diz que a agência pode considerar um endereço de IP de um servidor, acessado por centenas de pessoas, como um “alvo”.
O Post passou quatro meses vasculhando 160.000 emails e mensagens vazadas por Edward Snowden, e isso é apenas uma parte das comunicações interceptadas pela NSA e armazenadas em seus bancos de dados entre 2009 e 2012. Quase metade dessas mensagens eram de residentes dos EUA, segundo analistas da NSA. O Post explica que muitas das mensagens contém informações privadas:
Muitos outros arquivos, descritos como inúteis pelos analistas mas ainda assim retidos, têm uma qualidade surpreendentemente íntima. Eles contam histórias de amor e corações partidos, conteúdo sexual ilícito, crises de saúde mental, conversões políticas e religiosas, ansiedades financeiras e esperanças perdidas. A vida diária de mais de 10.000 pessoas que não eram alvos de investigações foi catalogada e gravada.
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O Post descreve mensagens incluindo relatórios médicos, registros escolares de crianças, fotos de família, e tudo isso pertencente a pessoas que não interessavam à NSA, mas estão nos bancos de dados da agência.
Dezenas de fotos mostram bebês e crianças em banheiras, em balanços, esparramados de costas e beijados por suas mães. Em algumas fotos, homens mostram seu físico. Em outras, mulheres aparecem de lingerie, inclinando-se sugestivamente em uma webcam ou fazendo poses em shorts e biquínis.
Legalmente, a NSA só poderia definir como alvo pessoas fora dos EUA. Interceptar mensagens de cidadãos dos EUA deveria exigir um mandado de uma corte especial de vigilância. Mas a agência tem uma rede bem ampla, e a maior parte das pessoas que caíram nas buscas da NSA não deveriam ser consideradas alvos.
Mas enquanto outras agências de espionagem seguem diretrizes e descartam, por exemplo, chamadas telefônicas grampeadas feitas por esposas e filhos de suspeitos, os dados que Snowden entregou ao The Post indicam que a NSA não segue essas regras.
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Mesmo que a NSA já tenha anteriormente dito que não consegue estimar quantos cidadãos dos EUA foram vigiados em seus programas, o Post diz que “não é óbvio o motivo da NSA não conseguir oferecer ao menos uma contagem parcial, considerando que seus analistas rotineiramente escolhem ‘pessoas dos EUA’ e mascaram suas identidades, em muitos casos, antes de entregar relatórios de inteligência.”
Com base no relatório de transparência de comunidade de espionagem de 26 de junho, o Post estima que quase 900.000 pessoas foram alvo da NSA – alvos legais ou não.
O relatório completo é extenso e assustador, mas o Post aponta que a coleção de dados revela algumas informações importantes sobre a segurança nacional dos EUA:
Entre o conteúdo mais valioso – que o The Post não vai descrever em detalhes para evitar interferência em operações em andamento – está a revelação de um projeto nuclear secreto no exterior, negociação com um aliado ostensivo, uma calamidade militar relacionada a um inimigo, e a identidade de invasores agressivos nas redes de computadores dos EUA.
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Snowden, no entanto, diz ao The Post que esses fatores bem-sucedidos não justificam a vigilância feita em pessoas inocentes, nem o armazenamento de seus dados privados nos servidores da NSA.
“Mesmo que alguém consiga justificar a interceptação inicial e inadvertida de fotos de bebês e cartas de amor de pessoas inocentes,” ele diz, “o armazenamento contínuo em bancos de dados governamentais é preocupante e perigoso. Quem sabe como aquelas informações serão usadas no futuro?”
Desde que soubemos pela primeira vez sobre as práticas da NSA, muita gente suspeitou do nível da vigilância em pessoas comuns. O Post confirma que de fato é alta, e isso infelizmente não é tão surpreendente. Mas a revelação de que nove em dez das mensagens são irrelevantes, e o fato da NSA guardar indefinidamente essas mensagens, adiciona uma nova camada à discussão.
A NSA, aparentemente, é um elefante digital: suas orelhas são grandes e ela nunca esquece nada, mesmo quando ouve o que pessoas inocentes dizem. [The Washington Post]
O post A NSA armazena dados de pessoas inocentes dos EUA, incluindo conversas e fotos pessoais apareceu primeiro em Gizmodo Brasil.