por Elis Monteiro, jornalista do Telefonia ETC
Na Wikipédia, a palavra ÓDIO é definida como um sentimento intenso de raiva e “traduz-se na forma de antipatia, aversão, desgosto, rancor, inimizade ou repulsa contra uma pessoa ou algo, assim como o desejo de evitar, limitar ou destruir o seu objetivo”. Já a Enciclopédia Barsa dá um sentido mais próximo – traduz ódio como “paixão que leva alguém a desejar a desgraça do outro e tentar ou fazer-lhe mal”. Seja como for, os dois significados trazem, nas entrelinhas, a mesma ideia de que odiar resulta na vontade de destruir, aniquilar. Será que isso explica o que nós, que vivemos na Web e da Web, encontramos todos os dias, em todos os ambientes, em todas as redes sociais? Os haters estão entre nós e são uma multidão ruidosa, barulho este talvez fruto da tal paixão.
Tentando encontrar uma forma simples de explicar o que é um hater, nos permitimos certa licença poética – o termo hater (do inglês hate, que é odiar) significa bem mais do que simplesmente “pessoa que odeia”. Não há, em todo o nosso vernáculo, uma tradução ao pé da letra porque o hater é mais do que alguém que odeia algo. É alguém que luta para detratar esse algo, que adora odiar e que dissemina este ódio. Com uma ferocidade apavorante.
De onde vem esse sentimento negativo pode ser que nunca descubramos. Mas que ele é visível, ah é. Tome-se como exemplo o vídeo veiculado pelos jornais da TV Globo no qual um policial aparece dando um tiro nas pernas de um suspeito imobilizado. Sob quaisquer circunstâncias, bastaria o mínimo de discernimento das regras da sociedade – as mais básicas que sejam – o ato seria digno de reprovação: o policial, um representante do estado, agiu como juiz e carrasco, atirando num suspeito que, naquele momento, não representava perigo.
Mas… no mesmo momento em que tal matéria era publicada nos sites dos jornais, os haters apareceram em bandos para odiarem juntos a TV que veiculou a notícia, o cinegrafista que filmou a cena e o fato de o comando da PM ter decidido expulsar o policial. “Bandido bom é bandido morto” foi o mínimo do que se encontrava ali. Tanto ódio sendo destilado que muitas perguntas vêm imediatamente à cabeça: “onde vivem essas pessoas, quem são elas, por que odeiam tanto, o que passa pelas suas cabeças ao explanar, em público, que o policial devia ter dado o tiro na testa e não nas pernas”?.
Esse é apenas o mais recente dos exemplos, mas há todo tipo de hater para todo tipo de situação. Se você é usuário de Mac e em algum momento diz isso em público, aparecem diversos haters de Apple que, ao mesmo tempo, são amantes de Windows. Destilam ódio em cima de você porque não suportam ter suas escolhas contrariadas. Se você usa Android, é odiado por quem usa iPhone; se ao contrário, você é esnobe e vendido. Por que uma pessoa não pode simplesmente gostar de alguma coisa, um objeto, uma pessoa, e ter aquela sua preferência respeitada, já que opinião é como impressão digital – cada um tem a sua?
Já presenciei discussões no Facebook nas quais todo mundo se odiava – um era gay e odiava os homofóbicos e também os homossexuais que não se assumem; o outro era negro e dizia que gay sofre menos preconceito do que os “da cor”; quem era protestante jogava a culpa nos católicos que, por sua vez, odiavam aqueles que não comungam de suas crenças; e só pra deixar tudo ainda mais belo, ateus lutando contra crentes, defendendo suas crenças em… nada! (sim, existe um movimento de haters ateus militantes que não acreditam em Deus e que odeiam quem acredita).
Ora, o que se vê são pessoas, seres humanos, se comportando simplesmente como… xiitas. Isso mesmo. Agindo como Osama Bin Laden, talibãs que não aceitam as diferenças e jogam aviões de palavras em cima de edifícios de opiniões.
Os haters odeiam porque acham bonito odiar ou porque está na moda – NÃO ESTÁ, eu ouso discordar. Odeiam porque sentem necessidade de contestar, mesmo quando nem sabem do que se está tratando. Se não conhecem o oponente, não sabem nada sobre sua história de vida, julgam e condenam com palavras tolas e supérfluas – hipócrita, idiota, imbecil, ignorante e palavrões mil. Nem param pra pensar que mesmo quem tem opiniões formadas muda de ideia a todo instante, porque no final das contas somos todos metamorfoses ambulantes, como já pregava o pastor Raul.
As redes sociais são a maior invenção da internet desde, vamos lá, o e-mail. Promovem a reunião de pessoas e de ideias, criam o ambiente perfeito para causas serem expostas e abraçadas, para o encontro e a aproximação de pessoas, diminuindo mais ainda as distâncias geográficas; são mais uma ferramenta de interação social, haja vista que só temos uma vida, que ora está em modo online, ora em modo offline. Não dá duas vidas paralelas nas quais possamos nos comportar de formas diferentes – em uma, somos seres corajosos e capazes de bravatas homéricas; em outra, somos cordeiros indignados e calados.
O que deve ficar em nossas cabeças é: será que odiamos assim também em nossas vidas pessoais, quando desligamos o smartphone ou o notebook? Se sim, não está na hora de pensarmos em produzir algo útil com todo esse sentimento represado que não uma multidão de touros soltos em busca de um bumbum para golpear?
Será que todos merecem nosso ódio? Ok, não peço que todos sejam Pollyannas à espera do melhor do ser humano e da vida, acreditando que todo mundo deve amar a todos, incondicionalmente. Só nos permitamos perceber que há mais sentimentos entre o amor e o ódio do que imagina sonhar nossa vã filosofia. Sendo assim, por que não aprendemos a lançar mão de um mashup de outros sentimentos – tolerância, sensatez, paciência, parcimônia, educação, moral, dentre tantos outros – como forma de nos protegermos do ódio – o nosso próprio e o dos outros?
*Elis Monteiro é jornalista especializada em tecnologia, telecomunicações e novas mídias e ama todo mundo. Mentira! Odeia Priscila Presley porque casou com o Elvis em seu lugar.