Uma das maiores mamilos polêmicas do Facebook envolve a questão de termos nossas vidas vendidas como mercadoria. Por mais que o acesso não nos seja cobrado diretamente pelo titio Mark, sabemos que a rede social ganha dinheiro vendendo a nossa vida.
O mais louco disso tudo é que se você pensar no ~feice~ como uma simples empresa prestadora de serviços, nós, os usuários, deveríamos ser os clientes, certo? No entanto, essa relação tradicional de negócio não rola nem de perto na web. Por aqui, em uma porção de sites, temos o acesso totalmente free e não pagamos nadinha pra desfrutar os serviços oferecidos.
E é aí que está o problema, pois, pra muitos, mesmo não precisando colocar a mão no bolso, pagamos muito caro pela utilização e não nos damos conta de que não somos os clientes e sim, servimos de produto para os anunciantes.
No youPIX Chat de hoje, resolvemos debater essa questão com vários especialistas do mundo wébico pra que vocês manolos possam concordar, discordar, comentar, criticar, enfim, pra que vocês também possam opinar sobre a pergunta: afinal, no Facebook, somos o cliente ou a mercadoria?
Acho interessante quando tentamos classificar as pessoas em brancos e negros num país de mulatos 🙂
Nós somos o cliente mas também somos a mercadoria, são esses paradoxos legais dos tempos modernos. Nós recebemos um serviço de comunicação e armazenagem de conteúdo e pagamos com os dados que deixamos no Facebook.
É quase como os animais criados na fazenda que deixam o adubo pra trás pra colaborar com o ecossistema. A vantagem é que ninguém no Facebook nos sacrifica pra colocar no açougue, ao contrário da fazenda.
Os e-mails mais legais que eu recebo de empresas são da Amazon, eles usam os dados da minha navegação de compra para fazer com que minha experiência de compra seja cada vez melhor, dificilmente alguém reclama do uso que a Amazon faz.
Ainda existe muita ignorância sobre os resultados dessa interferência do Facebook na nossa comunicação, uns dizem que nos cercamos apenas de conteúdos que concordam com a nossa opinião, mas na vida offline também é assim, se brigamos constantemente com alguém evitamos encontrar com aquela pessoa, se uma revista é desagradável deixamos de lê-la. O Facebook não está criando tantos comportamentos novos como falam, na maioria das vezes ele está digitalizando e amplificando coisas que já fazíamos.
Se a gente olhar para o conceito clássico, somos apenas usuários do Facebook. Os clientes, na realidade, são os anunciantes/empresas.
Acredito que o mais importante seja entender em qual categoria de tecnologia o Facebook se enquadra. Há uma teoria sobre a existência de dois tipos de tecnologias. As “tecnologias generativas” se mantêm abertas a qualquer modificação externa. Os usuários guiam as mudanças e a inovação e a disrupção são condições de uso. A própria internet entra nesta categoria. Nas “tecnologias estéreis“, por sua vez, os usuários são obrigados a usar o produto da forma como o fabricante deseja (por isso não é pedido o consentimento dos consumidores antes de qualquer alteração), além disso, nesse tipo de tecnologia, as aplicações são amarradas a uma rede de controle.
O Facebook, por exemplo, entra na classificação de “tecnologias estéreis”. Ou seja, os usuários têm que usar o produto nos estritos termos do fabricante. Isso ajuda a nos dar um parâmetro sobre a questão de sermos ou não mercadoria no Facebook.
Tudo é lindo no digital quando não é você quem paga a conta. Talvez uma boa maneira, aliás, de enxergar o digital seja pensar na geladeira de casa: você cresce acreditando que toda vez que abrir de madrugada a porta milagrosa vai ter danoninho e laranjada… até chegar tua vez de colocar comida lá dentro. Por mais divino que sejam os danoninhos e internets e youtubes e facebooks, eles não são teu direito divino nem caíram do céu: tem alguém ralando pra matar a sua fome. Mas isso, claro, é o tipo de coisa da qual ninguém gosta de ser lembrado, é ou não é? Só tem graça porque é de graça.
O digital revolucionou quase tudo, menos as contas no fim do mês. E absolutamente revolucionário não foi nem a busca nem o video nem os webservices nem redes sociais nem a nuvem: revolucionário foi alguém ter descoberto como ganhar dinheiro fácil com isso. A busca do Google podia ser genialíssima, mas se não fosse a grande sacada dos links patrocinados, a empresa não teria saído da garagem. O facebook podia conectar todo mundo do mundo, mas se não fosse a grande sacada de estimular a galera a publicar trivialidades sem parar, eles não teriam onde pendurar anúncio. Se você quiser entender as coisas que bombam no digital (e são pouquíssimas, o resto tem que suar a camisa), pense ao contrário: não foi a galinha cabeça-de-vento que inventou o ovo tão elegante, foi o ovo que inventou a galinha besta pra botar mais ovos 🙂
Idem pra TV: ela não existe pra passar novela e seriados e noticiários interrompidos por comerciais, ela existe pra mostrar comerciais interrompidos pela novela. Quando um facebook te pergunta o que você está fazendo e você responde seja o que for, a resposta concreta é: você está criando de graça mais um espaço para pendurar anúncio, e de quebra está chamando (de graça) a atenção de mais meio mundo pra… novos anúncios. O teu bebê? O teu cachorro? Gato, por-do-sol, taça de vinho? A plataforma agradece, mas pra ela é tudo a mesma coisa: gente achando graça em trabalhar de graça.
Transformar a água de todos em vinho pra poucos é uma revolução mesmo, mas uma revolução ao contrário: ao invés das lutas sofridas pra dar poder a quem trabalha e acabar com a mais-valia, estamos alegremente trabalhando de graça pra dois ou três patrões indiferentes. Estamos entregando barato o que há de mais caro nas nossas vidas.
Claro que tem nomes bacanas pra isso: social media, web 2.0, lifestream, citizen journalism, crowdsourcing, user-generated content, memes e outros buzzwords que você talvez tenha pagado caro pra aprender (taí outra maneira esperta de ganhar dinheiro com digital: enfeitar o peru). Eu prefiro fugir desse desbunde e pensar sempre em quanto tempo e afeto e energia estamos todos investindo pra, no final, enriquecer meia dúzia de três ou quatro. Eu ainda acho mais honesto pagar e ser pago. Isso sim não tem preço.
Para o Facebook, nós somos mercadorias, não clientes. A rede social criada por Mark Zuckerberg é modificada constantemente, em especial quanto às configurações de privacidade, sem que nenhum participante solicite essas mudanças, ou mesmo seja avisado. Isto é, da noite para o dia, o Facebook interfere na forma como os perfis são apresentados ao mundo, independente da vontade do proprietário daquela identidade. Em minha opinião, esse é o tipo de tratamento que se dá a coisas, não a pessoas. Não é preciso perguntar a uma caixa de sapatos se posso mudá-la de prateleira, mas, se eu mudo uma pessoa de lugar contra a vontade dela, estou tolhendo sua liberdade – e cometendo um crime, também. A meu ver, portanto, o Facebook trata os usuários como mercadorias, não como clientes.
Além disso, o Facebook vende a personalidade de seus usuários para empresas, agências de marketing e, possivelmente, governos. É claro que a televisão e os jornais têm há muito tempo como modelo de negócios vender a audiência para anunciantes. Porém, essa audiência é anônima, são grupos sociais expressos em resultados de pesquisas de mercado. As pessoas são encaixadas em categorias previamente definidas, como classe econômica, gênero, localização geográfica, idade. No caso do Facebook, os dados fornecidos de boa-fé pelos usuários a respeito de seus gostos, seus hábitos, sua personalidade, são reunidos para formar categorias a respeito de uma determinada faixa de público. Esse tipo de data-mining é muito mais invasivo do que as pesquisas de mercado usadas por emissoras de TV para vender sua audiência. É possível refinar infinitamente os dados inseridos pelos usuários do Facebook, até descobrir, por exemplo, quantos frequentadores entre 18 e 24 de um determinado bar de Porto Alegre preferem certa marca de cerveja, em quais horários bebem, em que dias da semana. Daí a fazer um perfil bastante preciso de um indivíduo, com base nos locais que frequente, livros que lê, músicas a que ouve, é um passo curto.
Então, sim, o Facebook trata as pessoas como mercadorias. Todavia, também é preciso reconhecer que não foi o Mark Zuckerberg quem as transformou em mercadorias. Foram as próprias pessoas que passaram a se comportar como mercadorias, a se preocuparem mais em parecer do que em ser, a deixarem de lado a auto-expressão para adotarem a conformidade. E isso nem mesmo começou com a Internet, é um processo de massificação que vem desde o surgimento dos meios de comunicação de massa, no início do século XX. A Internet apenas aprofunda essa tendência, potencializa os meios pelos quais um ser humano pode ser transformado em mercadoria.