Por sua importância traduzimos o artigo da The Economist de hoje (23/3/2016) sobre a situação atual do governo de Dilma Rousseff aqui para você, leitor do Jornal do Empreendedor.
A presidente denegrida deve renunciar agora
As dificuldades de Dilma Rousseff vem se aprofundando por meses. O enorme escândalo em torno da Petrobras, a gigante estatal de petróleo da qual ela já foi presidente, tem implicado algumas das pessoas muito próximas a ela. Ela agora preside uma economia sofrendo sua pior recessão desde a década de 1930, em grande parte por causa dos erros que ela mesmo fez durante seu primeiro mandato. Sua fraqueza política tornou seu governo quase impotente diante do aumento do desemprego e da queda dos padrões de vida. Seus índices de aprovação estão mínimos e milhões de brasileiros tem saído às ruas para cantar “Fora Dilma!”.
E, no entanto, até agora, a presidente do Brasil pôde razoavelmente afirmar que a legitimidade conferida por sua reeleição em 2014 estava intacta, e que nenhuma das alegações feitas contra ela justificaria seu impeachment. Como os juízes e policiais que estão perseguindo alguns dos membros mais altos em Partido dos Trabalhadores (PT), ela podia declarar de cara limpa seu desejo de ver a justiça sendo feita.
Agora, ela perdeu essa capa de credibilidade (ver artigo). Em 16 de março, Rousseff tomou a decisão extraordinária de nomear seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, para ser seu chefe de gabinete. Ela justificou a ação como o contratasse pela sua capacidade política. O Lula, como ele é conhecido por todos, é um operador político astuto: ele poderia ajudar a presidente sobreviver a tentativa do Congresso de realizar seu impeachment e talvez até estabilizar a economia. Mas apenas alguns dias antes, Lula já havia sido detido para interrogatório por ordem de Sérgio Moro, o juiz federal encarregado da investigação da Petrobras (apelidada de “lava-jato”), que suspeita que o ex-presidente lucrou com o esquema de corrupção (ver Bello). Os promotores do estado de São Paulo acusaram Lula de esconder a propriedade de um condomínio em frente à praia. Ele nega as acusações. Ao adquirir a patente de um ministro do governo, Lula teria imunidade parcial: apenas o tribunal supremo do país poderia julgá-lo. No entanto, um juiz no tribunal já suspendeu a nomeação.
Este jornal tem argumentado que ou o sistema judicial ou os eleitores –não os políticos tentando o impeachment dela em causa própria – devem decidir o destino da presidente. Mas a contratação de Lula por Rousseff parece uma tentativa grosseira de impedir o caminho da justiça. Mesmo que isso não tenha sido sua intenção, terá sido o seu efeito. Este foi o momento em que a presidente escolheu pelos interesses estreitos de sua tribo política em detrimento do Estado de direito. Ela, assim, fez-se imprópria para permanecer como presidente.
Três maneiras de deixar o Planalto
A forma com que ela sai do Planalto, o palácio presidencial, importa muito. Nós continuamos a acreditar que, na ausência de provas de criminalidade, o impeachment de Rousseff é injustificado. O processo contra ela no Congresso se baseia em alegações não comprovadas de que ela usou truques de contabilidade para esconder a verdadeira dimensão do deficit orçamentário em 2015. Isto nos parece um pretexto para expulsar uma presidente impopular. A ideia, defendida pelo chefe do comitê de impeachment, é que se os congressistas deliberarem o destino de Dilma ao ouvir “as ruas”, criariam um precedente preocupante. As democracias representativas não devem ser governadas por protestos e pesquisas de opinião.
Há três maneiras de remover Rousseff sob bases mais legítimas. A primeira seria a de mostrar que ela obstruiu a investigação da Petrobras. Alegações feitas por um senador PT que ela fez isso podem formar a base de um segundo pedido de impeachment, mas elas não foram até agora comprovadas e a presidente os nega. A tentativa de Rousseff de proteger Lula da acusação pode fornecer mais motivos. Uma segunda opção seria uma decisão pelo Tribunal Eleitoral do Brasil de convocar uma nova eleição presidencial. Ele pode fazer isso, se descobrir que sua campanha de reeleição em 2014 foi financiada com subornos canalizados através de executivos da Petrobras. Mas esta investigação será prolongada. A maneira mais rápida e melhor para Dilma deixar o Planalto é que ela se demita antes de ser levada para fora.
Sua renúncia iria oferecer ao Brasil a chance de um novo começo. Mas a renúncia da presidente não iria, por si só, resolver muitos problemas subjacentes do Brasil. Seu lugar seria inicialmente tomada pelo vice-presidente, Michel Temer, líder do Partido do Movimento Democrático Brasileiro. O Sr. Temer poderia dirigir um governo de unidade nacional, incluindo os partidos da oposição, que, em teoria, pode ser capaz de embarcar em reformas fiscais necessárias para estabilizar a economia e fechar um déficit orçamentário que está perto de 11% do PIB.
Infelizmente, o partido do Sr. Temer está tão profundamente enredado no escândalo da Petrobras quanto o PT. Muitos políticos que iriam participar de um governo de unidade, incluindo alguns da oposição, são popularmente vistos como representantes de uma classe dirigente desacreditada. De 594 membros do Congresso, 352 enfrentam acusações de delito criminal. Uma nova eleição presidencial daria aos eleitores uma oportunidade de confiar as reformas a um novo líder. Mas mesmo isso deixaria a apodrecida legislatura lá até 2019.
O Judiciário, também, tem perguntas a responder. Os juízes merecem grande crédito pela responsabilização dos empresários e políticos mais poderosos do Brasil mas eles minaram sua causa por desrespeitar normas legais. O exemplo mais recente é a decisão do Sr. Moro de liberar conversas telefônicas gravadas entre Lula e seus associados, incluindo Rousseff. A maioria dos juristas acredita que somente o Supremo Tribunal pode divulgar conversas em que uma das partes tem imunidade legal, como a presidente possui. Isso não justifica a alegação de partidários do governo que os juízes estão realizando um “golpe”. Mas tornou fácil para os suspeitos da Lava Jato de desviarem a atenção de seus próprios erros para os erros de seus perseguidores.
A guerra de partidos e personalidades do Brasil obscurece algumas das lições mais importantes da crise. Tanto o escândalo Petrobras e a crise econômica têm suas origens em leis e práticas que existem a décadas. Tirar o Brasil dessa bagunça requer mudanças em atacado: controlar as despesas públicas, incluindo as aposentadorias; reformar as leis fiscais e trabalhistas que esmagam o crescimento e reformar um sistema político que estimula a corrupção e enfraquece os partidos políticos.
Estas não podem mais ser adiadas. Aqueles cantando “Fora Dilma!” nas ruas irão reivindicar a vitória se ela for deposta. Mas para o Brasil em si essa vitória seria apenas um primeiro passo.
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Artigo da The Economist.