Esquerda e direita podem concordar: fomos poupados de um segundo turno virulento. Doria versus Haddad reeditaria, para São Paulo, o clima venenoso da campanha presidencial de 2014.
Vila Olímpia e Vila Madalena se preparavam para um confronto apocalíptico. E eis que a periferia decidiu a questão, rejeitando o intelectual petista, bem como os nomes do velho fisiologismo, e optando pelo empresário tucano.
Mesmo sem novas eleições presidenciais, o povo deu um recado claro da direção que quer seguir.
A população quer um Estado eficiente, que entregue em serviços o que cobra nos impostos, e que enterre, de uma vez por todas, o ranço ideológico que demoniza a iniciativa privada e o mercado. Quer trazer para a política práticas de gestão empresarial. E quer, é claro, se livrar do PT.
Haddad não cooperou. Sua postura distanciada, trazendo soluções supostamente geniais da Europa e tentando impô-las a ferro, fogo e multa não deu certo. Teve, ainda, a oportunidade de sair do PT, mas optou por ficar nele e bradar contra o “golpe” em sua propaganda.
Sem paciência para ideologia, São Paulo optou pela imagem de um empresário de sucesso que promete trazer essa vibração para a Prefeitura. Optou por uma campanha que levou sem medo a promessa da privatização a lugares nunca antes considerados: o estádio do Pacaembu, o parque Ibirapuera, até os corredores de ônibus.
Com um Estado tão ineficiente como o nosso, e com a velha política só pensando em aumentar impostos, a melhora na gestão ajudaria a recuperação sem punir a sociedade.
Com um Estado tão ineficiente como o nosso, e com a velha política só pensando em aumentar impostos, a melhora na gestão ajudaria a recuperação sem punir a sociedade.
Agora, cabe perguntar: será Doria esse gestor excelente que sua campanha vendeu? Uma de suas propostas, a de agendar exames médicos do SUS em hospitais privados no horário da madrugada, foi notoriamente desastrada: não só ter que ir ao hospital distante às 3h da manhã é um estorvo bastante grande, como o custo da mão-de-obra médica nesse horário é mais alto. A medida aumentaria a ineficiência do gasto estatal.
Haddad, por outro lado, teve seus acertos na gestão. Incapaz de construir as centenas de creches prometidas, matriculou crianças em creches privadas conveniadas, aí sim melhorando o custo-benefício do gasto público.
Aquilo que Doria simboliza recebeu um claro mandato da população. Mas o símbolo nem sempre corresponde à realidade.
Por melhor que tenha sido seu resultado, ainda perdeu para o “brancos, nulos e abstenções”, favorito inconteste desde 2013. A suspeita da classe política como um todo —que ajudou Dória— continuará no ar e não o poupará se ele decepcionar.
Na câmara de vereadores, vemos também o primeiro passo de uma renovação: o Partido Novo, sem fazer coligações e sem usar o fundo partidário na campanha, elegeu Janaína Lima, moradora do Capão Redondo que virou uma das líderes do Vem Pra Rua, vai cortar gastos de gabinete e reduzir assessores.
Bora, Doria!
Liderança, meritocracia, sair de baixo e chegar lá, são valores que estão em alta. Não é hora de se lamuriar; São Paulo quer trabalhar e cumprir com otimismo nossa vocação para o sucesso. Temos um país em crise para inspirar. “Bora, Doria!” —o voto de confiança está dado; a resposta em caso de fracasso será impiedosa.
JOEL PINHEIRO DA FONSECA é economista formado pelo Insper e mestre em filosofia pela USP.