Henry Ford é um homem que dispensa apresentações. Fundador da Ford Motor Company – uma das maiores companhias automotivas do mundo – presente em todos os continentes, e tendo quase duzentos mil empregados, sendo referência global no mercado de automóveis convencionais, veículos de luxo, veículos comerciais e veículos de passeio, além da prestação de serviços automotivos, o famoso industrial americano natural de Greenfield, Michigan, foi o eixo axial da grande revolução industrial que modificou completamente o panorama social, financeiro e profissional do seu país – e, por conseguinte, do mundo – no princípio do século 20. Mas de que maneira ele conseguiu realizar isso?
Henry Ford tinha as aptidões inerentes e fundamentais que definem todo bom empreendedor: ele era um homem extremamente curioso, e tinha iniciativa. Nascido a 30 de julho de 1863, aos vinte e oito anos, Ford começou a trabalhar como engenheiro para a companhia de Thomas Edison, que prestava serviços desenvolvendo estações de energia elétrica. Nunca desperdiçando tempo, as horas ociosas eram gastas em experimentos pessoais envolvendo engrenagens, combustíveis e um veículo rudimentar, mas plenamente funcional, confeccionado pelo próprio Ford. Desta maneira, depois de muito trabalho, estudo e persistência, foi criado o veículo que ficou conhecido como Quadriciclo Ford. Em 1896, ao conhecer pessoalmente Thomas Edison, Ford mostrou a ele os seus experimentos, e Edison o estimulou, com louvor e entusiasmo, encorajando-o a prosseguir com suas experiências automotivas.
Suas experiências pessoais acabaram fortalecendo sua confiança com relação ao produto que ele buscava aperfeiçoar, e isso deu a Ford confiança suficiente para realizar ambições ainda maiores. Impressionado com a sua determinação e potencial, o magnata William Murphy decidiu emprestar dinheiro a Ford, incentivando-o a iniciar a sua própria indústria, e assim foi fundada a Companhia de Automóveis de Detroit. Não obstante, esta primeira incursão no mundo automotivo seria para Ford uma grande fonte de desgosto e decepção. Os automóveis produzidos pela companhia, além da qualidade duvidosa, eram muito caros, e Ford simplesmente não tinha os meios ou a experiência para solucionar os incomensuráveis problemas logísticos e funcionais de uma indústria. Logo, Ford aprenderia que nem todos os problemas de uma linha de produção industrial eram de simples resolução. Desolado, observando seus sonhos, propósitos e objetivos diluírem-se diante de si, Ford não viu solução senão fechar a companhia, dois anos depois de ter sido estabelecida.
No entanto, a ideia em si – produzir veículos em escala industrial – era tão boa que parecia valer a pena insistir. Depois da desolação inicial, uma nova injeção de ânimo fez Ford prosseguir com seu objetivo. Em 1901, William Murphy, Henry Ford e acionistas da antiga companhia tomaram a decisão de embarcar em uma nova empreitada automotiva, e assim fundaram a Henry Ford Company. Não obstante, as muitas cabeças pensantes na diretoria executiva levaram a divergências que fizeram Ford se desligar da companhia no ano seguinte. Com a saída de Henry Ford, a companhia mudou de nome para Cadillac.
Com um novo de time de investidores, Ford decidiu tentar novamente, em 1903. Esta seria a sua terceira tentativa em suas incursões pelo setor automotivo. No entanto, agora, ao assegurar para si próprio maior controle, além de quase absoluto poder de decisão e criação, e tendo acumulado uma significativa experiência com as companhias anteriores, a Ford Motor Company seria responsável por uma verdadeira revolução na vida do cidadão americano.
Ao continuar de forma ferrenha – com muita determinação – seus experimentos automotivos, em um esforço coletivo que envolvia mais três designers – Ford elaborou um veículo que revolucionaria o mercado automobilístico americano. Ao criar e disponibilizar o famoso Modelo T – o primeiro carro de consumo de massa – fabricado por uma linha de produção industrial, que não apenas era capaz de produzir um enorme número de veículos em pouco tempo, como permitiu que o custo para produzi-lo fosse drasticamente reduzido, Henry Ford fez do automóvel um produto acessível aos americanos da classe média, sendo que até então esta era uma exclusividade da elite aristocrática. Ao inovar também, com a criação do sistema de franquias, a Ford Motor Company não apenas conquistou um enorme segmento do mercado automotivo, mas ampliou o seu escopo de atuação, permitindo que praticamente todo americano proletário pudesse ter o seu Modelo T na garagem, o que de fato impulsionou o mercado, todo o sistema comercial que estava agrilhoado a ele, e por extensão, provocou uma revolução na vida do cidadão americano comum. Agora, além dos bondes, do trem e da bicicleta, o proletariado podia se dar ao luxo de ter o próprio carro na garagem da sua casa. Uma nova opção em locomoção fora disponibilizada para milhões de cidadãos americanos.
Analisar a trajetória de Henry Ford é interessante por diversas perspectivas, e podemos até mesmo compará-lo com empreendedores de outras áreas, como Steve Jobs. Afinal, grandes empreendedores tem muita coisa em comum. Embora Henry Ford e Steve Jobs lidassem com produtos muito diferentes, ambos compartilhavam do desejo de acessibilidade aos seus produtos. Ambos queriam disponibilizá-lo ao maior número de pessoas possível. Não obstante, é fascinante analisar o que ambos tinham em comum. Por que empreendedores como Steve Jobs e Henry Ford foram tão revolucionários? Afinal, assim como Steve Jobs não inventou o computador, Henry Ford também não inventou o automóvel. Então, por que ficaram tão famosos? O que eles fizeram de diferente, que tanto eu como você poderíamos fazer? Na verdade, eles fizeram algo muito simples. O que eles mais faziam era pensar. É atribuída a Henry Ford a famosa frase “pensar é o trabalho mais difícil que há, e é por essa razão que tão poucos que se dedicam a isso”. Embora esta frase circule muito pela web, sendo atribuída a Henry Ford, é impossível confirmar a veracidade desta afirmação. De qualquer maneira, esta sentença contém a fórmula de um princípio fundamental do seu caráter, da sua personalidade, e do seu sistema de trabalho. O raciocínio de Henry Ford com relação a automóveis – assim como o de Steve Jobs com relação a computadores – levou-o a elaborar uma solução que tornou possível disponibilizar o seu produto para as massas. Para isso, ambos pensaram de maneira muito similar, fazendo a si próprios as seguintes perguntas:
- Como posso produzir este produto em larga escala?
- Como produzi-lo com o menor custo possível, mas mantendo um elevado padrão de qualidade?
- Como fazer para tornar este produto acessível ao maior número de pessoas possível?
E isto basicamente se tornou um elemento fundamental para tudo o que ambos faziam. Pensar, pensar e pensar. Henry Ford também era altamente comprometido com a redução de custos. Estava sempre pensando em como tal engrenagem, tal mecanismo, tal parafernália poderia ser substituída por outra melhor, mas com custo inferior. Evidentemente, todas e quaisquer melhorias deveriam ser implementadas sem perda da qualidade. Como qualquer empreendedor de valor, Ford não queria introduzir porcarias no mercado. Além de levar em consideração o consumidor, a durabilidade do produto e o seu tempo de vida útil, Henry Ford não queria, evidentemente, um produto medíocre associado ao seu nome.
A persistência é outro componente fundamental para um grande negócio.
A persistência é outro componente fundamental para um grande negócio. Lembre-se de que a Ford Motor Company foi a terceira companhia automotiva que Henry Ford abriu, depois do fracasso das duas anteriores. Mas certamente, se ela não tivesse dado certo, ele teria fundado uma quarta companhia, e assim ele teria prosseguido, até seus planos lograrem êxito. A persistência e a insistência são duas qualidades fundamentais, que estarão presentes no caráter e na personalidade de qualquer empreendedor. Qualidades estas, muito presentes também em Steve Jobs, que amargou alguns fracassos agonizantes, antes de se tornar um empreendedor de sucesso.
Mas as revoluções fordistas não pararam por aí. Henry Ford foi instrumental para uma série de mudanças na vida social e profissional da sociedade americana, em diversos aspectos. O líder e fundador da Ford Motor Company foi fundamental para a consolidação da semana de cinco dias úteis, ao invés de seis. Tendo uma visão do capitalismo como gerador global de prosperidade, Ford via como essencial para uma sociedade funcional o bem-estar do trabalhador em todos os aspectos de sua vida. Tempo livre permitiria ao trabalhador descansar, e assim este seria mais produtivo durante o expediente, afinal teria o final de semana inteiro para repousar, e retornaria ao trabalho na segunda-feira disposto e revigorado. Isso poderia torna-lo mais feliz, satisfeito e produtivo. Um empreendedor não tem o direito de exigir produtividade de trabalhadores exauridos, mas empregados felizes e dispostos, por outro lado, podem produzir com mais facilidade, e com um nível de competência e dedicação muito mais elevado. Tempo livre também permitiria ao trabalhador consumir mais, afinal não adianta gerar riqueza, se o trabalhador não tiver tempo disponível para gastar o que ganha. Tempo livre significa mais consumo, mais riquezas circulando, e consequentemente, um aumento na qualidade de vida do trabalhador. Portanto, tempo livre para o trabalhador significava para as indústrias um índice de produtividade superior, em quantidade e qualidade. Você pode até pensar que Ford raciocinava dessa maneira por razões egoístas. Não obstante, lembre-se de que ele queria estender a todas as classes sociais americanas – dentro da medida do possível – benefícios que eram até então exclusivos das classes aristocráticas, a começar pelo seu produto, e, por extensão, pelos privilégios que apenas o tempo livre é capaz de proporcionar ao indivíduo.
A visão de Henry Ford concernente ao capitalismo e ao empreendedorismo era visivelmente abrangente: ela envolvia todos os aspectos da sociedade, e entendia e atendia aos desejos específicos do indivíduo. Tudo começava na ponta da linha de produção, para ter, do outro lado, um consumidor feliz e satisfeito, usufruindo de um produto que facilitaria a sua vida por completo. E a linha de produção – bem como os demais setores da companhia – deveria ter apenas trabalhadores contentes, satisfeitos e felizes, sendo que o trabalho deveria representar apenas um aspecto de suas vidas, e não toda ela.
O resultado? O Modelo T ficou em produção por quase vinte anos, e foi adquirido por mais de dezesseis milhões de americanos. Depois disso, a companhia continuou a crescer, e hoje vale aproximadamente 224 bilhões de dólares.
Evidentemente, o valor e as virtudes de um empreendedor não devem ser medidos em cima do seu legado financeiro e material. Se isso for levado em consideração, obviamente não há o que discutir quanto ao valor de Henry Ford, em termos absolutos. Não obstante, a avaliação correta de um empreendedor deve estar abalizada sobre o nível de benefícios que o mesmo levou à sociedade, tanto direta quanto indiretamente. Um empreendedor como Henry Ford, que gerou empregos, modificou a forma e a estrutura da jornada de trabalho, ponderou sobre formas e maneiras de melhorar os aspectos pessoais da vida do trabalhador, e revolucionou a vida do cidadão americano comum ao oferecer a ele a possibilidade de ter em sua própria casa um produto para facilitar a sua locomoção, fez tudo aquilo que o verdadeiro empreendedorismo realmente se propõe a fazer: desenvolver o progresso da sociedade, projetar e disponibilizar benefícios e ampliar as possibilidades pessoais do indivíduo. O empreendedorismo começa como um objetivo imaterial pessoal que deve resultar em múltiplas considerações altruístas. Deve começar dentro de nós, mas projetar-se externamente, impactando de forma benéfica o maior número de pessoas possível. E lembre-se: você não precisa revolucionar a vida de milhões de pessoas para ser como Henry Ford. Se você melhorar a vida de dez, duzentas ou seiscentas pessoas, já terá sido um empreendedor magnífico. O homem que inventou a mochila de rodinhas por exemplo, na verdade não inventou a mochila. Assim como Henry Ford e Steve Jobs, ele concentrou sua atenção em algo que já existia, e desenvolveu o produto, transformando-o em algo melhor. Ao adicionar uma alavanca e um par de rodinhas a uma mochila, milhares de crianças não precisam mais levar nas costas livros e cadernos pesados, que antes prejudicavam suas colunas. Isso é ser um empreendedor de verdade. Embora você realmente precise inovar, para manter-se no mercado, conquistar clientes e ganhar dinheiro – pois é isso o que mantém uma empresa –, beneficiar as pessoas deve ser a maior aspiração de um empreendedor. Com um grande empreendedor como Henry Ford, aprendemos que facilitar a vida das pessoas deve ser o nosso maior e mais precioso legado.