Qual tipo de escrita você acredita que precisa desenvolver?
Os segredos da boa escrita tem sido debatidos à exaustão. Mas a boa escrita, pode acabar apontando para o ideal errado.
Em “About Writing: Seven Essays, Four Letters, and Five Interviews”, o celebrado autor e crítico literário Samuel Delany, sintetiza seu mais valioso insight em 35 anos de ensino da escrita criativa, uma grande lição para os escritores amantes da escrita.
Uma de suas principais observações é a diferença crucial entre a boa escrita e a escrita talentosa, sendo que a primeira, em grande parte é um produto técnico e a outra, uma questão de sensibilidade linguística e estética.
Embora elas tenham coisas em comum, a boa escrita e a escrita talentosa não são a mesma coisa.
Se você começar com uma história confusa, obscura e mal escrita e aplicar as regras da boa escrita a ela, provavelmente pode transformá-la em uma história simples, lógica e claramente escrita.
Ainda assim, ela não será uma boa história. A principal falha de 85% a 95% de toda a ficção é que elas são banais e sem graça.
Agora, velhas histórias sempre podem ser ditas com uma nova linguagem. Você pode até mesmo adicionar novos personagens para elas, você pode usá-las para dramatizar novas ideias.
Mas, eventualmente, até mesmo em uma nova linguagem, personagens e ideias perdem a capacidade de revigorar.
Seja no conteúdo ou no estilo, na matéria ou na abordagem retórica, a ficção que é muito parecida com outra ficção é algo ruim por definição.
Por mais paradoxal que pareça, a boa escrita como um conjunto de restrições (ou seja, quando a escrita é apenas boa), produz a maior má ficção. Em um outro nível, essa realização é o que finalmente coloca a maioria dos escritores há quilômetros da escrita.
A escrita talentosa, no entanto, é algo mais. Você precisa de talento para escrever.
A boa escrita é clara. A escrita talentosa é energética. A boa escrita evita erros. A escrita talentosa faz as coisas acontecerem na mente do leitor – vividamente – o que a boa escrita, feita com clareza e lógica, não consegue fazer.
Virginia Wolf sabia que a sutileza era a chave quando aconselhou que nós temos que permitir que os significados submersos deveriam permanecer submersos, não declarados.
O escritor talentoso, Delany nos lembra, é um mestre da indução. O escritor talentoso, muitas vezes usa especificidades e evita generalidades. Porque elas são sugeridas, ao invés de indicadas, e podem dar ao leitor muito mais força do que se tivessem sido articuladas.
As palavras têm a sua própria firmeza. Por isso, devemos usar a palavra certa, e não o seu primo de segundo grau. Mas a grande escrita não é apenas uma questão de concisão.
O escritor talentoso, muitas vezes usa frases retoricamente interessantes, musicais ou líricas que são mais breves do que o caminho de dizer a mesma coisa.
O escritor talentoso pode explodir, como um microscópio verbal, alguma sensação fugaz ou ação, destrinchar insights e descrever subsensações que todos reconhecemos, mesmo que raramente tenhamos considerado isso antes.
Em frases complexas com várias cláusulas que se relacionam de maneiras complexas, o escritor talentoso irá organizar essas cláusulas na ordem cronológica em que ocorrem os referentes, apesar das relações gramaticais lógicas.
A verdadeira potência da escrita talentosa reside em sua capacidade para comprimir as sensações sutis que consome tudo em um pacote de informações extremamente eficientes.
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Este artigo foi adaptado do original, “Good Writing vs. Talented Writing”, do Brain Pickings.